Vida de professor da rede pública

Súplica Cearense

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Ciência e História - Teratologia


Monstros e prodígios
Conheça a história da teratologia - o estudo dos defeitos congênitos e suas causas - em sua longa trajetória da superstição à ciência.
por Jerônimo Teixeira
Escamas: o menino tinha escamas. Dizem que cheirava a pescado e que só comia peixe. Nasceu em Nápoles, no início do século 17, e fez sucesso em excursões pela Europa, exibindo-se como uma aberração itinerante. Os médicos hoje imaginam que ele teria um caso grave de ictiose, doença congênita que dá à pele uma aparência escamosa. Uma doença terrível, sem dúvida, mas nada que devesse impedi-lo de viver uma vida plena e produtiva. Calcula-se que cerca de 5% a 10% dos nascimentos resultam em algum tipo de defeito congênito. A pesquisa médica ainda tem muito trabalho a fazer nessa área. Ainda assim, há espaço para otimismo. O preconceito é renitente, mas as vítimas dessas doenças não são mais vistas como híbridos animais nem precisam levar a vida como atração circense.
Por mais que adotemos uma generosa postura de aceitação da diferença, o fato é que nenhum pai ou mãe espera um filho com defeito congênito. A criança vem ao mundo cercada de expectativas. Pais, avós, irmãos mais velhos, todos aguardam a chegada de uma criaturinha com corpinho rechonchudo, rostinho angelical e cinco dedos em cada mão. Comunicar à família que o bebê não saiu de acordo com os projetos é um dos momentos mais duros para um médico. “Salvo as malformações menores, tais como a polidactilia (condição em que a criança tem mais do que cinco dedos) ou o pé torto congênito, que não costumam ser muito dramáticas, as outras geralmente constituem um quadro complexo”, diz o médico geneticista Gilberto Lima Garcias. Ele cita a síndrome de Meckel-Gruber como uma das mais terríveis de que já tratou – as manifestações clínicas podem incluir cérebro exposto, lábio leporino e rins imensos. “Mostrar isso à família pode ser um momento muito difícil.
Gêmeos siameses e anencefalia também são malformações que chocam muito as famílias e a própria equipe hospitalar, tornando esses momentos muito dramáticos”, complementa o médico.
Professor da Universidade Católica de Pelotas e da Universidade Federal de Pelotas, Rio Grande do Sul, Gilberto recentemente publicou De “Monstros” e Outros Seres Humanos, livro que inclui uma breve revisão histórica da teratologia, como é chamado o estudo dos defeitos congênitos, seus mecanismos e causas. Até mesmo o nome dessa ciência tem ecos funestos: o radical grego teratos quer dizer “monstro”. E os monstros andam sempre rondando a etimologia das doenças congênitas. A deformação em que a criança nasce com apenas um olho, por exemplo, é conhecida como ciclopia, lembrando o Ciclope, gigante caolho que o aventureiro Ulisses derrota na Odisséia, poema épico de Homero. A síndrome de Hurler – deficiência genética no metabolismo de açúcares complexos que geralmente conduz à morte antes dos 10 anos – já foi chamada de gargulismo. As deformações faciais típicas desta doença supostamente tornariam suas vítimas parecidas com as gárgulas, aqueles monstros de pedra que adornam catedrais góticas.
A história cultural da deficiência física é marcada pelo preconceito, pelo medo da diferença que se expressa ali onde menos esperamos – em nossa própria descendência. Também há um elemento de fascínio perverso pela suposta “aberração”, que se revela na exibição de deficiências raras em espetáculos de circo (leia texto na página 60) ou, atualmente, em programas de televisão. A arte pré-histórica já traz registros de seres humanos com malformações; na Austrália, foram encontrados desenhos e esculturas primitivas, datando provavelmente de 5000 a 4000 a.C., retratando dicéfalos conjugados (isto é, gêmeos siameses com duas cabeças num mesmo corpo). Na Antiguidade, a norma geral parece ter sido a condenação à morte para recém-nascidos defeituosos. Um texto chinês do período Qu’in (200 a.C.) estabelecia punições para infanticidas, mas ressalvava que matar crianças deformadas não constituiria crime.
Entre as cidades da Grécia antiga, Esparta era particularmente rigorosa com os deficientes, que eram vistos como um ônus inútil para a pólis. Mas mesmo na luminosa Atenas os filhos malformados eram abandonados à própria sorte, o que equivalia a condená-los à morte por inanição. Considerava-se que o “monstro” não deveria ser enterrado para não conspurcar a terra.
As teorias para explicar os defeitos congênitos eram variadas e, da nossa perspectiva moderna, bastante bizarras. Demócrito, filósofo pré-socrático, acreditava que os monstros surgiam de uma dupla emissão do líquido seminal, a qual daria origem a dois embriões que se misturavam, crescendo de forma confusa. Mais tarde, o filósofo grego Aristóteles sugeriria o contrário: a insuficiência de esperma poderia produzir o indivíduo malformado. Na Antiguidade também vigorava a curiosa crença de que a imaginação da gestante seria capaz de imprimir marcas físicas no bebê – a chamada impressão (ou sugestão) materna.
Talvez a melhor ilustração dessa curiosa doutrina esteja em uma lenda que envolve o pai da medicina, Hipócrates. Conta-se que uma esposa grega estava prestes a ser condenada à morte por adultério quando Hipócrates apresentou-se como testemunha de defesa. As provas da acusação pareciam irrefutáveis: branca e casada com um homem branco, a mulher dera à luz uma criança de tez escura. O médico, porém, tinha outra explicação para a pele suspeita do bebê. No quarto da jovem mãe, havia a pintura de um sarraceno. Recolhida a seus aposentos durante a gravidez, a mulher passara um longo tempo admirando a figura do negro. Por força da sua imaginação, a cor fora transmitida ao rebento, que assim virou mulato. A autoridade de Hipócrates deve ter sido grande, pois os jurados compraram a história. A mulher foi inocentada.
O caso acima é apócrifo. Consta de muitas crônicas antigas, mas não aparece nos escritos do próprio Hipócrates. Pode não ser verdadeiro, mas é certamente verossímil. A doutrina da impressão materna faria uma longa história na medicina, como você verá adiante. Nesse caso específico, o obscurantismo científico salvou a cara do obscurantismo moral, impedindo que a mulher fosse morta apenas por ter pulado a cerca do vizinho negro. Mas as impressões maternas não surgiram como desculpa para o adultério. Eram uma forma de explicar o que até hoje parece inexplicável para todos os pais: os defeitos congênitos.
Durante a Idade Média, como seria de se esperar, as malformações foram geralmente entendidas como punição religiosa: o pecado da família traduzia-se em defeitos no rebento. Também era corrente a idéia de que malformações fossem presságios, anúncios de algum grande evento, fosse ele catastrófico ou auspicioso. Essa concepção parece ter se estendido além da Idade Média. No século 16, o escritor francês Michel de Montaigne, em um de seus clássicos Ensaios, depois de descrever uma criança colada pelo ventre como um aborto com pernas e braços, mas sem cabeça, especula sobre o possível significado político desse portento: “Esse duplo corpo e esses múltiplos membros ligados a uma só cabeça poderiam muito bem constituir um bom prognóstico para o nosso rei, pressagiando a coexistência de vários partidos sob suas leis”. O próprio Montaigne, porém, ressalva que é melhor não confiar nesses presságios, que podem sempre ser desmentidos pelos acontecimentos.
Contemporâneo e conterrâneo de Montaigne, o cirurgião-barbeiro Ambroise Paré lançaria em 1573 um livro que se tornaria uma espécie de clássico da teratologia: De Monstros e Prodígios. Essa obra, que hoje poderia ser lida como peça de literatura fantástica, sintetizava muitas das convicções correntes entre os médicos. O texto era ricamente ilustrado com gravuras de sereias aladas, meninos com rabo de cachorro, crianças com cara de rã, mulheres com duas cabeças, potros com cabeça humana e que tais. Paré listava causas variadas para a criação de “monstros”: intervenção divina; ação de bruxos e demônios; excesso, falta ou corrupção do sêmen. A impressão materna destacava-se nessa etiologia fantástica. Paré dizia, citando autoridades antigas (inclusive Hipócrates), que uma gestante de imaginação ardente poderia imprimir marcas no filho. Recomendava, pois, que as mulheres não olhassem nem pensassem em coisas monstruosas no momento da concepção e nos primeiros meses de gestação.
A crença na impressão materna legou à história da medicina uma impressionante galeria zoológica. Já vimos o menino-peixe de Nápoles: a explicação médica aceita na época era de que sua mãe passara a gravidez assombrada por monstros marinhos, e essa aflição fantasiosa teria produzido as “escamas” na pele do garoto. De passagem pela Holanda em 1638, o anatomista dinamarquês Thomas Bartholin conta ter examinado uma jovem com cabeça de gato. Sua mãe teria se assustado, durante a gravidez, com o movimento de um felino escondido embaixo da cama. Menos drásticos em suas conseqüências, os sinais de nascença prestavam-se à perfeição para “comprovar” a estranha teoria. Os exames sempre descobriam no formato aleatório das manchas o desenho de algum objeto do desejo obsessivo da gestante.
A crença na impressão materna também abriu espaço para fraudes. O caso mais escandaloso foi o da camponesa Mary Toft, reconstituído pelo médico sueco Jan Bondeson na sua saborosa Galeria de Curiosidades Médicas. Mary estava grávida de cinco semanas quando viu um coelho em sua horta, em uma pequena aldeia do condado de Surrey, Inglaterra, em 1726. Perseguiu o bicho, mas não conseguiu alcançá-lo. A partir daí, foi dominada pelo desejo de comer coelhos. Quatro meses depois, ela abortou o que parecia ser um coelho malformado. E não parou por aí: seguiu parindo coelhos às dezenas, embora os pobres bichos sempre saíssem despedaçados. O estranho caso atraiu a atenção até mesmo da corte do rei Jorge I. Mary foi levada a Londres, onde acabou sendo desmascarada: descobriu-se que os coelhos supostamente paridos haviam sido introduzidos pela própria Mary em sua vagina. O caso foi muito embaraçoso para alguns médicos que haviam referendado a fraude.
Em certa medida inflamados pelo escândalo, começam a surgir, no século 18, trabalhos contestando a crença ancestral na impressão materna. O tema seria debatido ardorosamente pelos cientistas nos anos seguintes. Com tudo isso, em meados do século 19 ainda havia médicos sérios defendendo a teoria.
Mesmo hoje, quando os avanços da ciência médica e da genética aparecem quase diariamente nos noticiários, a crença popular na impressão materna subsiste. Quem já não ouviu dizer que os desejos alimentares de uma mulher grávida devem ser atendidos, por mais exóticos que sejam, sob pena de o bebê nascer com cara de legume ou fruta? Às vezes, obedecemos a essas superstições por brincadeira, porém mais gente do que se imagina ainda as leva a sério. “Um estudo realizado por nós em Pelotas demonstrou que a crendice popular a respeito da causa dos defeitos congênitos é muito grande”, diz Gilberto Garcias. A pesquisa encontrou mais de uma centena de causas fantasiosas para as malformações. Algumas parecem absolutamente arbitrárias, como a crença de que usar chaves penduradas no corpo durante a gravidez pode resultar em um filho com lábio leporino.
Outras seguem a lógica linear da impressão materna: derramar bebidas na mulher grávida origina manchas no corpo do bebê; comer frutas coladas origina gêmeos siameses; rir de deficientes pode determinar o mesmo problema na criança que está sendo gerada; passar por baixo de cercas pode levar o cordão umbilical a se enrolar em torno do feto. “Muitas mães temem ver cenas de sexo ou pornografia, pois poderão gerar filhos com problemas sexuais”, afirma o médico. “Essas idéias fantasiosas se originam basicamente na busca de explicação para transtornos de origem desconhecida. A própria classe médica tem dificuldades para explicar a origem de muitos defeitos, o que acaba colaborando com o desenvolvimento de mitos e crenças.”
Isso não quer dizer que a medicina não conheça progressos nessa área. “Graças aos avanços da genética molecular, especialmente derivados do Projeto Genoma Humano, o conhecimento sobre as bases genéticas de muitos defeitos congênitos tem avançado bastante”, afirma Lavínia Schüler-Faccini, professora do Departamento de Genética da UFRGS e co-organizadora de um Manual de Teratogênese (Editora da UFRGS). Mas ainda há muito o que fazer. Lavínia explica que, segundo estudos consagrados, 15% dos defeitos congênitos são de causas predominantemente genéticas, outros 15% são de causas predominantemente ambientais e 20% seriam decorrentes de uma soma de fatores genéticos e ambientais. O restante – ou seja, metade dos casos – é de causa desconhecida. Em seu livro, Gilberto apresenta números ainda mais desconsolados – cerca de 60% das doenças congênitas seriam de causas desconhecidas.
A prevenção inclui cuidados básicos mais ou menos conhecidos: a gestante não deve beber nem fumar e precisa se alimentar bem. Descobriu-se também que a idade avançada aumenta as chances de o filho ter síndrome de Down. Exames pré-natais como o ultra-som e a amniocentese detectam problemas congênitos de maior gravidade, o que poderia ser utilizado para a prevenção através do aborto – a lei brasileira, porém, não permite essa alternativa. Ainda pouco conhecida é uma medida simples e barata para evitar defeitos de fechamento do tubo neural, como a anencefalia e a espinha bífida: o consumo de ácido fólico – uma vitamina presente em folhas verdes e em suplementos vitamínicos – pela mulher no período da concepção e no início da gestação diminui as chances desses distúrbios.
Ainda dá para esperar avanços na prevenção de defeitos congênitos. Lavínia observa, porém, que não se deve imaginar que o risco de uma gravidez algum dia chegue a zero. Mesmo em condições ideais – uma gestante jovem, bem-alimentada, que não fuma nem bebe –, ainda persiste uma taxa de risco básica de 1% a 2%. “Em muitos casos, o aparecimento de doenças genéticas ou defeitos congênitos é casual, um fenômeno particular de uma determinada gestação e independente de fatores de risco. Faz parte de nossa variabilidade”, explica Lavínia. A única coisa que podemos – aliás, devemos – levar a zero é o preconceito com relação ao deficiente.
Casos como o de Violetta, que nasceu sem braçose sempernas,eram cercados de superstições
Lionel Bilgraski achava que tinha nascido com esta aparência porque sua mãe teria visto a morte violenta de seu pai
Toney, o “rapaz com pele de crocodilo”, era atração de um circo de Nova York

O circo humano
Muitos dos casos clássicos da teratologia – o estudo dos defeitos congênitos – foram também estrelas de circo, especialmente no século 19. Se o estigma do problema físico impedia que o indivíduo pudesse seguir uma profissão convencional, a humilhante – e às vezes lucrativa – alternativa era explorar o fascínio e a ignorância do público, exibindo-se sob a lona dos freak shows (“espetáculos de aberrações”). O caso mais conhecido é o de Joseph Merrick, nascido em Leicester, Inglaterra, em 1862. Ele tinha 2 anos quando sua mãe notou que a pele do filho crescia de modo estranho, formando calombos na cabeça e no pescoço. Os defeitos tornaram-se cada vez mais acentuados à medida que o menino crescia. O lado direito de sua cabeça cresceu de forma desproporcional. Seu braço direito também era enorme, e o crescimento irregular inutilizou sua mão. Joseph teve de deixar a casa cedo, por incompatibilidade com o padrasto.
Tentou a vida como vendedor de rua e operário, mas o abuso por parte dos colegas era demais. Acabou se empregando com um promotor de espetáculos, que lhe deu o apelido pelo qual ficaria conhecido: Homem-Elefante. Merrick foi então “descoberto”pelo doutor Frederick Treves, que mais tarde seria o médico da família real britânica. Treves exibiu seu paciente célebre nas sociedades científicas da época. Merrick ainda voltaria ao circo, mas acabou sendo acolhido em caráter permanente por um hospital de Londres. Morreu de asfixia, em 1890, ao deitar-se para dormir – o peso de sua cabeça esmagou a traquéia. Sua história inspirou um filme de David Lynch, O Homem-Elefante (1980).
Os médicos da época diagnosticaram a condição de Merrick como elefantíase, problema do sistema linfático que causa inchaço no corpo. Mais tarde, o consenso científico foi de que o Homem-Elefante sofria de um caso extremo de neurofibromatose, moléstia congênita que causa crescimento anormal do sistema nervoso. No final dos anos 90, exames radiológicos do esqueleto de Merrick, conservado até hoje no Hospital Real de Londres, revelaram que o crescimento ósseo era incompatível com os casos conhecidos de neurofibromatose – o Homem-Elefante não tinha, por exemplo, a espinha curvada que é típica desses casos. O diagnóstico mais aceito hoje é de que Merrick sofria de síndrome de Proteu, um distúrbio de crescimento raríssimo que só foi identificado em 1979.
Os gêmeos conjugados são chamados de siameses por conta da fama de Chang e Eng Bunker, naturais do Sião (atual Tailândia). Ligados na altura do esterno, hoje os dois provavelmente poderiam ser separados cirurgicamente, mas quando nasceram, em 1811, a medicina não tinha muito o que lhes oferecer. Chang e Eng fizeram carreira nos Estados Unidos como atrações do célebre circo Barnum and Bailey. Cansados da vida nos picadeiros, acabaram se estabelecendo como fazendeiros no estado da Carolina do Norte. Cortejaram e se casaram com duas irmãs da comunidade local. Os dois morreram com 63 anos, deixando 21 filhos (11 de Eng e 10 de Chang).
Bem mais triste foi o destino de Julia Pastrana, a mulher barbada que causou sensação ao ser exibida como uma espécie intermediária entre o ser humano e o macaco. Consta que Pastrana era um índia mexicana, nascida em 1834, mas os dados sobre sua origem são duvidosos. Tinha pêlos abundantes e grossos não só no rosto, mas também nos braços. Com pouco mais de 20 anos, ela excursionou pelos Estados Unidos, exibida como a “Maravilha Híbrida”. Atravessou o oceano Atlântico em 1857 para começar sua carreira européia, em um espetáculo em Londres que incluía canto e dança. Seu empresário, Theodore Lent, levou-a em seguida a uma longa excursão pela Europa continental. Apesar dos pêlos abundantes, Julia era descrita como uma mulher delicada, talentosa e inteligente. Talvez seduzido por esses encantos, Lent, o empresário, casou-se com ela. Ou talvez tenha sido uma estratégia para preservar seu ganha-pão: Julia sofria por ter uma aparência como aquela e falava a amigos de sua vergonha por ser exposta como uma aberração.
O casal estava em Moscou quando descobriu que Julia ficara grávida. Os médicos temiam que o parto fosse difícil, pois a pélvis dela era muito estreita. Em 1860, deu à luz um menino igualmente peludo, que viveu só 35 horas. Ela mesma morreria cinco dias depois. A história fica particularmente bizarra a partir daqui. Lent vendeu Julia e o bebê para um anatomista russo que os embalsamou com muito capricho. Mais tarde, alegando direitos de marido e pai sobre os dois corpos, Lent tomou-os de volta. Voltou a excursionar pela Europa para exibir as múmias. Depois de sua morte, sua segunda mulher – que também era barbada! – doou Julia e o bebê a um empresário alemão. A partir daí, as múmias seguiriam um triste périplo, passando de um a outro museu de curiosidades. Em 1990, foram redescobertas no porão de um instituto médico legal em Oslo, Noruega. O médico Jan Bondeson examinou Julia e o filho.Em seu livro Galeria de Curiosidades Médicas, ele revela que a índia mexicana não só tinha crescimento anormal de cabelos, mas também sofria de deformações dentárias, com hiperplasia da gengiva. Bondeson acredita que essas características encontradas em Julia Pastrana são parte de uma síndrome genética rara.

Para saber mais
NA LIVRARIA:
De "Monstros" e Outros Seres Humanos, Gilberto Lima Garcias, Ed. da Univ. Católica de Pelotas, 2002
Galeria de Curiosidades Médicas, Jan Bondeson, Record, Rio de Janeiro, 2000
Freaks, Aberrações Humanas, Akmitsu Naruyama, Livros & Livros, Portugal, 2000
A INTERNET:
www.worldcf.org/index.html

A Onda



A onda
Gordeeff
A Onda (Die Welle) é a refilmagem alemã para ao cinema de um clássico televisivo americano, The Wave (“A onda”, em inglês), de Norman Lear (que recebeu o Emmy Award for Outstanding Children's Program de 1981), baseado na história de Ron Jones (Take as Directed).
A história original conta a experiência pessoal de Ron Jones, professor de História Mundial na Cubberley High School, em Palo Alto, Califórnia, em 1967. Durante uma aula, Jones pergunta a seus alunos se seria possível o surgimento de um regime fascista nos EUA – especificamente o nazismo. Os alunos acham bobagem e refutam a ideia, mas concordam em participar de uma experiência de duas semanas.
Como em todo regime fascista, há a figura central do líder, e, usando de sua prerrogativa de professor, Jones começa a implementar rígidas regras de conduta e disciplina ao grupo de alunos, tais como formas de se sentar, de saudação, senso de comunidade e conjunto, que foram nomeadas pelo grupo com o termo A onda. Ao final do quarto dia do experimento, temendo pela segurança de alguns alunos que se recusaram a participar do grupo, Jon interrompe-o.
Na versão alemã, a história se inicia com uma aula sobre Autocracia, de Rainer Wenger, professor do Ensino Médio, que na verdade gostaria de falar sobre Anarquia, tema escolhido por outro professor. Como para a Alemanha este assunto é muito mais incômodo e, como esta cultura também é mais pragmática, é interessante assistir às duas versões (a alemã e a estadunidense), comparando-as tanto em termos culturais e sociais quanto em termos temporais – já que a estadunidense é de 1981 e a alemã é de 2008.
Mas, apesar das diferenças, ambas as produções não perdem o fio condutor: mostram como, pela criação de um ideal de vida e senso de grupo, é possível a manipulação das massas e, ao mesmo tempo, como esse “poder” é facilmente extrapolado. Isto é, como boas intenções podem ter consequências desastrosas – o próprio experimento – e como más intenções podem ser facilmente vestidas de uma aura de verdade e retidão – no caso do fascismo.
Há também inúmeras observações que podem ser feitas tanto a respeito da experiência em si como em relação às versões realizadas. A história instiga questionamentos sobre o comportamento adolescente, sobre a humanidade, sobre a selvageria, algo que vai muito além da simples análise de sistemas políticos – que nada mais são que reflexos do próprio homem. As duas versões mostram como as questões individuais acabam sendo influenciadas e influindo nas condutas do grupo, colocando o espectador em dúvida sobre quando uma ação é individual ou quando ela é grupal.
Entretanto, mesmo dentro da experiência não há somente o resultado indesejado. A versão alemã mostra que muitos alunos que não são tão brilhantes ou participativos têm seus comportamentos positivamente transformados quando estimulados de forma mais contundente ou desafiadora.
A própria rixa entre os professores – dos estudos de Autocracia e Anarquia – mostra, irônica e interessantemente, que as aulas de Anarquia eram insuportáveis para os alunos, enquanto a sala do estudo autocrático ficou lotada.
Estimulando o senso de unidade da turma – por exemplo, acabando com as panelinhas e dispondo alunos com notas melhores junto com os de notas mais baixas – o professor fez com que certas inimizades entre os alunos e mesmo alguns preconceitos dentro do grupo desaparecessem em prol de algo maior e positivo: o crescimento e o desenvolvimento individual, que, consequentemente, seria o desenvolvimento de uma turma mais forte – já que não há como alcançar um sem o outro. É o conhecido ditado “a união faz a força” posto em prática.
O mais interessante nessa história é que ela se desenvolve de forma a mostrar o caminho para aquele grupo como um caminho bom e positivo, mas que, de repente, muda de sentido radicalmente, extrapolando e exacerbando comportamentos a partir do momento em que o senso de grupo passa a dar sensação de poder e de superioridade em relação aos não fazem parte dele – é a falta do desenvolvimento do senso de tolerância.
Essa narrativa faz pensar sobre nosso próprio sistema de ensino e educação, não no sentido de instrução, mas como conduta e comportamento, algo que não é responsabilidade única da escola, mas da sociedade como um todo, tendo o núcleo familiar como origem – isso os filmes retratam bem. Não há como ter uma sociedade participativa se não educamos os indivíduos para isso. Não há como ter alunos mais sensíveis, mais empáticos com seus colegas se a imagem da individualidade for sempre apresentada como algo preponderante às necessidades do grupo. Não há como ter alunos responsáveis se eles nunca enfrentam as consequências dos próprios atos. Não há como ter uma sociedade melhor e mais justa se os indivíduos dessa sociedade não progridem moralmente.
A Onda é daqueles filmes que deveriam ser obrigatórios (sendo um pouco autocrata) em toda escola, exibido para alunos a partir dos 13 anos. É um banquete para trabalhar com os alunos – servindo às várias disciplinas.
A versão alemã entrou no circuito brasileiro em 21 de agosto de 2009, e ainda pode ser vista em algumas salas cults. A versão americana pode ser encontrada no Youtube em duas partes: http://www.youtube.com/watch?v=BVRXXbU-z7U e http://www.youtube.com/watch?v=GXi71XBdh1o).
Está também disponibilizada em baixa resolução no site http://www.thewave.tk/, onde é possível encontrar mais detalhes sobre o assunto.

Tempo e História



Os tempos da História
Prof. Dr. Eduardo Marques da Silva

Aqui se tem a sensação que vivemos um eterno festival de síndromes. Surpreendentemente diríamos que presenciamos sempre o acometimento da verdadeira Síndrome de Chalaça ou mesmo que tudo decorresse da conhecida Síndrome de Peter Pan ou ainda que fosse um significativo sinal permanente das síndromes de que estamos sacudidos. Basta observarmos com mais atenção o nosso panorama político parlamentar que podemos constatar que a nossa luta é de vivermos "expurgando formatações". Tais síndromes são repetitivas e se renovam na nossa burguesia e nos comportamentos de nossa classe média!
Pobre Brasil, que de tanto querer se fazer passar por Brazil, com seu desenvolvimento para fora, como afirmaram Pedro Paes e O. Sunkel, não se deu conta ainda de seu tempo de duração escravista nos ombros. Parece que tudo aconteceu, como ainda acontece, em sono profundo, letárgico, como num nirvana. Pois também parece que se esqueceu de observar que quatrocentos anos de chicote & pelourinho não foram suficientes para que se aprendesse que tratando os oriundos de nossa escravidão, agora mergulhados na pós-escravidão, tenham se convertido na atualidade em corpos calados (Malaguti, 2004). Busca desastrosa e desesperadamente uma sobrevida que o retire do quadro complexo que lhe atribuiu o seu multiculturalismo.
Sabemos da possibilidade de mapear o perfil comportamental de um determinado segmento social, mesmo se não for considerado segmento social oficialmente e apenas seja considerado grupo ou corpos sociais e socioculturais, calados e contestatoriamente autônomos, pela urbanidade da modernidade. Sofremos de uma síndrome de início de cegueira catastrófica no tempo presente ou de seus elementos mais perniciosos.
Podemos mapeá-los pelos poderes derivados de seus comportamentos sociais através de signos registrados na linguagem, através das suas palavras, com a contribuição recente na academia dada por Jean-François Lyotard (1988).
Arthur Charles Clarke, escritor de ficção científica, disse em entrevista que "Pode ser que nosso destino neste planeta não seja adorar a Deus, mas sim criá-lo". E isso nos faz pensar, pois concepções de Deus >variam tanto de uma pessoa para outra que não há claro consenso sobre a natureza de divindade existir. “Deus está morto! Deus permanece morto! E quem o matou fomos nós!”, afirma Clarke. Nós seriamos os algozes dos algozes da divindade.
Não teremos de nos tornar a nós próprios deuses para parecermos dignos do todo-poderoso, como afirmaClarke. Nunca existiu ato mais grandioso na face da Terra, e quem quer que nasça depois de nós certamente passará a fazer parte, entregue a este, de uma história superior a toda história até hoje(Friedrich Nietzsche.
O primeiro registro histórico de divindade data do período Paleolítico, estendendo-se ao Neolítico ou civilizacional. É quando se acredita que tenha surgido um sentimento humano de vínculo com algo maior do que o próprio Ser, a Terra e a Natureza, os Ciclos e a Fertilidade. A adoração da Deusa mãe, a Mãe Terra ou Mãe Cósmica se estabeleceu como a primeira religação divina, religião humana. Em torno desse sentimento se formariam ‘sociedades matriarcais’, todas centradas na ‘imagem feminina’, talvez pelo ‘poder de concepção’. Os hebreus da Mesopotâmia foram os primeiros a chamar esta Deusa Mãe de Pai e, ainda que masculinizassem a ideia básica de família e continuidade da vida, sua sociedade não era efetivamente patriarcal. Segundo Joseph Campbell, o patriarcalismo surgido com os hebreus se deveu à atividade belicosa de pastoreio de gado bovino e caprino e às constantes perseguições religiosas, que desencadeavam o nomadismo e a perda de identidade territorial. Podemos ver, segundo Braudel, as transformações, conforme suas ferramentas metodológicas de classificar períodos e fatos na história
História e ciências sociais: a longa duração
Para Braudel, há uma crise geral das ciências do homem, todas esmagadas sob seus próprios progressos, devido à acumulação dos novos conhecimentos e da necessidade de um trabalho coletivo. Direta ou indiretamente, todas são atingidas, mas permanecem às voltas com um humanismo retrógrado, insidioso. Preocupam-se com seu lugar no conjunto monstruoso das pesquisas antigas e novas, cuja convergência hoje se adivinha. As ciências do homem sairão dessas dificuldades? Talvez tenham a ilusão disso, pois no risco de voltar a falsos problemas ei-las preocupadas em definir metas, métodos e suas superioridades, como isoladamente Lévi-Strauss, na Antropologia Estrutural, rumo aos procedimentos da Linguística – horizontes da história “inconsciente” e o imperialismo juvenil das matemáticas qualitativas. Uma ciência que ligaria a ciência da Comunicação, a Antropologia, a Economia Política, a Linguística, mas a própria Geografia se divorciaria da História! A História, a menos estruturada das ciências do homem, aceita todas as lições de sua múltipla vizinhança. As outras ciências sociais, mal informadas da crise dos anos 1940 a 1960, preferem desconhecer.
“Nos trabalhos dos historiadores, um aspecto da realidade social do qual a história é boa criada, hábil vendedora: essa duração múltipla e contraditória da vida do homem não é apenas a substância do passado, mas o estofo da vida social atual”, uma razão a mais para assinalar a utilidade da História ou da dialética da duração, tal como ela se desprende da observação repetida do historiador, pois nada é mais importante, no centro da realidade social, do que essa oposição viva, repetida indefinidamente entre o instante e o tempo. A história se ilumina com uma nova luz: de experiências e tentativas recentes desprende-se uma noção precisa da multiplicidade do tempo e do valor excepcional do tempo longo: a história das cem faces deveria interessar às ciências sociais, vizinhas.
A História de curta duração, como se dizia no século XVI, enche a consciência dos contemporâneos, mas não dura. O homem se incorpora e depois redescobre a vontade ou o tempo curto da vida cotidiana, das ilusões, das rápidas tomadas de consciência – o tempo, por excelência, do cronista, do jornalista.
O passado é essa massa de fatos miúdos, brilhantes, obscuros ou repetidos. Fatos que constituem o despojo cotidiano da Microssociologia ou Sociometria. A política não é forçosamente ocorrencial nem é condenada a sê-lo. Os historiadores dos séculos XVIII e XIX haviam estado mais atentos às perspectivas da longa duração que a seguir somente grandes espíritos, comoMichelet, Ranke, Jacob Burckhardt, Fustel de Colange souberam redescobrir. Todo trabalho histórico decompõe o tempo decorrido. A história tradicional, atenta ao tempo breve, ao indivíduo, ao evento, habituou-nos à sua narrativa precipitada, dramática, de fôlego curto.
A História de média duração é o tempo conjuntural. Uma estrutura é a arquitetura de uma realidade que o tempo utiliza mal e veicula muito longamente. Algumas realidades, por viverem muito tempo, tornam-se elementos estáveis de uma infinidade de gerações: atravancam a história. A nova história econômica e social põe no primeiro plano de sua pesquisa a oscilação cíclica e assenta sobre sua duração. Hoje, ao lado do relato, há um recitativo da conjuntura que põe em questão o passado por largas fatias: dez, vinte ou cinquenta anos.
As mentalidades são posições de longa duração, os quadros mentais também. A dificuldade é discernir a longa duração no domínio em que a pesquisa histórica acaba de obter seus inegáveis sucessos. Dos séculos XIV a XVIII, até por volta de 1750, a circulação viu o triunfo da água e do navio, os surtos de progresso europeu. Situa-se uma história de amplitude secular. A longa duração se apresenta como um personagem complicado, amiúde inédito. Para o historiador, ocultá-lo é prestar-se a uma mudança de atitude, a uma alteração de pensamento, a uma nova concepção do social. É em relação a essas extensões de história lenta que a totalidade da história deve ser repensada, a partir de uma infraestrutura.
Todos os milhares de estouros do tempo da história se compreendem a partir dessa semi-imobilidade. A história é a soma de todas as histórias possíveis, uma coleção de misteres e de pontos de vista, de ontem, hoje e amanhã. O único erro seria escolher uma dessas histórias com a exclusão das outras. Trata-se de definir uma hierarquia de forças, de correntes, de movimentos longos e impulsos breves tomados de suas fontes imediatas, de um tempo longínquo. Cada atualidade reúne movimentos de origem, ritmos diferentes: o tempo de hoje data o de ontem, de anteontem etc.
O caminho até a globalização
Segundo Hobsbawm, o começo da globalização pode ser encontrado na chamada Era da Catástrofe, de 1500, quandotudo mudou, desencadeando o fenômeno conhecido como globalização.
Otomanos desembarcaram em Otrento, às portas de Roma, reativando as messiânicas crenças milenaristas e expulsando Veneza do comércio mediterrânico oriental. O império otomano domina o mediterrâneo oriental. Otomanos ameaçam o coração da Europa. Afirmava-se como a primeira potência naval do mediterrâneo oriental. Florença aproveita-se da guerra dos otomanos contra Veneza para obter privilégios comerciais. Otomanos exercem atração sobre os excluídos da cristandade ocidental.
Os lusos estabeleceram a comunicação entre Europa e a África e depois com a Ásia, cuja relação foi obra dos ibéricos. Graças a eles e aos predecessores judeus e árabes, a globalização também se estabeleceu com formas de comunicação distintas pelos algarismos e o cálculo astronômico. A conjuntura mundial em toda parte favorecia a expansão ibérica. A chegada de Cabral à costa do Brasil marca a data na história da astronomia ocidental. As expedições ibéricas inauguraram de outra forma o processo de globalização: aceleraram e intensificaram os contatos com as populações distantes.
Na América, chegou ao auge o império mexicano (Astecas) no reinado de Ahuitzoth. Houve então a sucessão no império mexicano. Morreu Ahuitzoth e seu sobrinho Montezuma o sucedeu, levando o império ao seu apogeu. Seria também a testemunha e a vítima da invasão espanhola em território mexicano. Espanhóis chegaram à América e reconquistaram Granada, na terra Ibérica. Nativos da América tomaram conhecimento da presença de europeus (desconhecidos) no Caribe. Espanhóis concluem a reconquista de Granada em terra Ibérica, mas de jeito nenhum a luta contra o Islã.
Com as conquistas portuguesas (Orã), espanholas (Trípoli), percebe-se que os ibéricos, no início do século XVI, concretizam o estrangulamento do Islã. Com a conquista da Malásia, os portugueses se estabelecem no sudoeste da Ásia. A primeira expedição espanhola só tocou a costa do México em 1517. No México como nos Andes, as previsões de uma destruição garantiam que as sociedades antigas tinham de fato previsto a conquista, embora não pudessem impedi-la, e que a derrota seria inevitável.
Referências
HOBSBAWM, E. J. Bandidos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1976.LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. 2ª ed. Rio de Janeiro: José Olímpio, 1988.
MALAGUTI, Vera. Rio de Janeiro: a cidade do medo. Rio de Janeiro: Revan, 2004.
SUNKEL, O. Desenvolvimento, subdesenvolvimento, dependência, marginalização e desigualdades espaciais: por um enfoque totalizante. In: BIELSCHOWSKY, R. (org.). Cinquenta anos de pensamento na CEPAL. Rio de Janeiro: Record, 2000.
SUNKEL, O. Um ensaio de interpretação sobre o desenvolvimento latino-americano. Rio de Janeiro: Difel/Fórum, 1975.
Publicado em 20 de abril de 2010

Mitologia



Por que trabalhar os mitos gregos?
Quem já teve a experiência de trabalhar História Antiga em sala-de-aula, certamente constatou uma dificuldade: a distância temporal e espacial dessa temática em relação aos nossos alunos do ensino fundamental, especialmente na 5ª série, que é o momento de aplicação desse conteúdo.
Esta oficina visa encurtar a distância e o estranhamento, despertar o interesse dos alunos e tornar possível o entendimento de alguns conceitos inerentes ao tema. Para isso propõe concretizar ao máximo o conteúdo, através de atividades que busquem naturalizá-lo, trazendo para a experiência do aluno o universo mental e cultural dos gregos antigos.
O poder de sedução da mitologia grega encontra grande repercussão entre crianças e jovens, falando diretamente ao seu gosto pelo lúdico e pela criatividade. O enfoque na narrativa oral auxiliará esta identificação, propiciando, ao mesmo tempo, a compreensão sobre a importância da palavra falada para a construção da história e da cultura nas civilizações antigas.
Elisa Goldman.
As cidades-estado gregas
A Grécia Antiga, chamada de Hélade pelos gregos, se localizava no sul da Península Balcânica, ocupando as ilhas do Mar Egeu e Jônio e o litoral da Ásia Menor. Esta civilização estava dividida em cidades-estado com um certo grau de independência política. Apesar da fragmentação política do mundo grego, as várias cidades-estado reconheciam-se como partes de uma mesma unidade cultural, com língua, costumes e valores comuns. Essa comunidade cultural formava uma civilização, ao qual se contrapunha o mundo "bárbaro".



Em toda cidade-estado grega havia espaços comuns a todos os grupos sociais e outros reservados aos grupos que eram, de alguma forma, diferenciados.
Todas as pessoas frequentavam o mercado e o teatro. Já a assembleia era reservada apenas aos que eram cidadãos, ou seja, homens livres descendentes de pessoas nascidas na cidade. O conselho e os tribunais eram reservados aos eleitos para suas funções, embora todo cidadão pudesse sê-lo. O estádio era frequentado por homens adultos e jovens com mais de 12 anos que tivessem tempo livre para praticar esportes. Todos esses lugares ficavam na parte baixa da cidade, a ágora.
No interior dos templos não eram admitidos fiéis. Eles deviam ficar do lado de fora, onde eram feitos os sacrifícios, e só através da porta de entrada podiam entrever a estátua do deus. Apenas os sacerdotes e os funcionários ocupavam o espaço do interior dos templos, que, em sua grande maioria, se localizavam na acrópole, local mais alto onde, nos períodos Micênico e Homérico, se situavam também os palácios dos reis e residia a comunidade. Com o crescimento da população, as regiões mais baixas foram sendo ocupadas e a acrópole ficou reservada às funções religiosas.
O que é Mitologia?
Os mitos fazem parte da tradição oral de um povo, ou seja, são narrativas que usam a palavra falada para transmitir e comunicar o modo de pensar desse grupo, preservando a memória e garantindo a continuidade de sua cultura.
As narrativas são passadas de geração a geração pelos contadores de histórias, principalmente os anciãos e poetas. Uma mesma história mítica pode surgir em diferentes versões, porque com o passar do tempo o mito é permanentemente recriado.
Alguns dos mitos gregos referem-se aos contatos e encontros amorosos entre os deuses e os seres humanos, dos quais nasciam os heróis. Um exemplo clássico é a História de Hércules (nome dado pelos romanos ao herói de força descomunal que em grego se chamava Héracles).

Baú de ideias:
Mito da origem do mundo - Teogonia - Hesíodo
Trabalhar a ideia de pluralidade cultural mostrando a existência de diversas cosmogonias. Sendo a Teogonia uma delas.
A narrativa da origem do mundo, segundo os gregos, a partir da versão de Hesíodo, no poema Teogonia (isto é, "nascimento dos deuses"):
Primeiro nasceu o Caos, a existência indistinta; depois nasceram a terra (Gaia) e Eros. [...] Caos gerou a Noite, que gerou o dia. A Terra gerou o céu (Urano), as Montanhas e o Mar; uniu-se ao Céu (Urano) e gerou os Titãs, Reia, Têmis, memória, os Cíclopes, fabricantes do raio, os Gigantes, de cinquenta cabeças e cem braços, e cronos, o tempo. [...]
[...] Guiados por Eros, os deuses se reproduzem: há os filhos da noite, entre os quais estão a Morte, o Sono, os Sonhos e as Parcas, divindades do destino, de cujos desígnios nem os deuses escapavam, que eram três; Fiandeira, Distribuidora e Inflexível, e a linhagem do mar: Nereu e as várias Nereidas, suas filhas Espanto, Ceto, entre vários outros.[...]
O Céu detestava os filhos, e escondia -os na Terra; até que ela, atulhada, criou uma foice e deu-a a seus filhos, para que castrassem o pai. Todos ficaram com medo, mas Cronos aceitou a missão, e, ao entardecer, quando o céu se deitava junto com a terra, a cumpriu. [...] A partir daí começa o domínio da segunda geração de deuses, encabeçados por Cronos. Cronos sabia que ía ter um destino semelhante ao de seu pai, ser destronado por um de seus filhos; então os engolia à medida que iam nascendo do ventre de Reia. Foi assim com Hera, Deméter, Héstia, Hades e Posêidon; quando Zeus nasceu, Reia deu uma pedra para Cronos engolir e escondeu o filho, que cresceu e cumpriu o destino de destronar o pai. Como ele fez isso não é dito; mas fez Cronos vomitar seus irmãos. Depois disso, aliado aos outros deuses e aos gigantes, derrotou os Titãs numa guerra terrível, na qual os deuses se aliaram aos Gigantes, filhos da Terra.
O domínio de Zeus marca a terceira geração de deuses. Ele repartiu o mundo com seus irmãos, Posêidon e Hades. Essa geração teve muitos filhos. De Zeus e Deméter nasceu Perséfone: de sua união com Memória nasceram as musas; com Leto, Apolo e Artêmis; com hera, ares Hebe e Ilítia; com Maia, Hermes; com Sêmele, Dioniso. Mas a primeira esposa de Zeus, Métis, a astúcia, foi engolida por ele, porque estava destinada a dar à luz dois filhos: um era Atena, e o outro seria aquele que destronaria seu pai. Zeus engoliu Métis e ficou astucioso, e gerou Palas Atena, que nasceu da sua cabeça.

A importância da tradição oral para a civilização grega
Devemos historicizar a disseminação da tradição oral entre os gregos. Essa questão é o cerne da reflexão que vamos propor na atividade em torno da Odisseia, de Homero.
"Historicizar" a tradição oral não significa localizar o aparecimento da escrita como um marco mais evoluído do ponto de vista linear. É bom lembrar, também, que o processo histórico não produz apenas mudanças, ele é constituído também de permanências.
Para compreendermos o lugar da tradição oral na cultura grega é preciso retomar o momento da entrada dos Dórios na Península Balcânica. Este povo indo-europeu foi responsável pela destruição da civilização Micênica e pela ocupação de Esparta na região do Peloponeso. Nesse contexto, a escrita caiu em desuso e houve uma significativa redução da vida urbana e do comércio. Muitos Aqueus fugiram para as ilhas do Mar Egeu e para as costas da Ásia Menor, onde fundaram várias cidades. Após as invasões dóricas, o conhecimento sobre a civilização Micênica passou a ser transmitido apenas por tradição oral pelos Aedos (cantores e poetas inspirados pela musa, que os impelia a cantar a glória dos homens). Estes percorriam a Grécia narrando fatos e histórias da época Micênica. Os aedos recorriam às repetições, que facilitavam o processo de memorização. Destituída do suporte da escrita, a memorização estava reduzida à simples transmissão oral.
É preciso atenuar as conquistas da escrita nas províncias do mundo grego. Devido à relativa raridade do objeto livro e ao pequeno número de letrados, os livros eram mais escutados do que lidos. Os filósofos, os médicos, os historiadores, todos se dedicavam a recitações públicas. O livro era escrito no interior de um amplo sistema cultural, cuja transmissão continuava a se fazer de forma oral e auditiva. A cultura tradicional nunca precisara da escrita para se fazer ou se dizer, pois se encontrava na memória comum a toda comunidade, seus princípios de organização e suas modalidades de aprendizagem.
Provavelmente, certas sociedades, mais do que outras, preocupam-se em colocar em ação meios não escritos de fixar sua tradição, seja confiando-a parcialmente aos profissionais da memória - virtuoses dos procedimentos mnemotécnicos - seja assegurando, por meio dos rituais, uma repetição regular, senão imutável, das palavras, das narrativas ou dos cantos litúrgicos.
Essa necessidade de sempre redizer e repetir é que confere à oralidade o seu modo próprio de criação.
A produção oral, por sua vez, se não for recebida imediatamente, captada por ouvidos atentos e salva do silêncio que a espreita desde o primeiro momento, acaba condenada ao esquecimento, destinada ao desaparecimento imediato, como se nunca tivesse sido pronunciada. Para poder penetrar e tomar seu lugar na tradição oral, uma narrativa, uma história ou qualquer obra falada deve ser entendida, isto é, deve ser aceita pela comunidade.
Baú de ideias
Os aedos
No canto VIII da Odisseia, o rei dos Feaces prepara-se para receber com as honras devidas um hóspede desconhecido. Na verdade, trata-se de Ulisses, arrastado pela tempestade até as suas praias. Ulisses penetra então na sala onde se desenrola o festim, para o qual foram imoladas “doze ovelhas, oito porcos de presas brancas e dois pacíficos bois”. Em seguida chega o aedo que o rei mandara buscar: “Um arauto adiantou-se, conduzindo o fiel aedo a quem a musa, por o amar, dera bem e mal: privara-o de visão ao matar-lhe os olhos, mas em troca tornara assim mais doce a suavidade do seu canto. Pontíono ofereceu-lhe um assento no meio dos convivas, um banco com pregos de prata, encostado a uma coluna. Depois de dependurar a lira pontiaguda por sobre a cabeça, suspensa de um gancho, mostrou-lhe como a tomar nas mãos. Colocou depois uma mesa ao seu alcance, uma mesa com um cesto de frutas e uma taça de vinho para que pudesse comer e beber sempre que o desejasse. Após isso, todos eles se serviram das iguarias oferecidas. Uma vez apaziguada a sede e satisfeito o apetite de quantos ali estavam, a musa impeliu-o a cantar a glória dos homens e, numa narrativa cuja fama chegava então aos céus, falou da contenda entre Ulisses e Aquiles, filho de Peleu...”. (Odisseia, p. 62 sqq) [pág.20 – O aedo e seu público – Claude Mossé].
O aedo, esse cantor inspirado pela musa, que anda de mansão em mansão evocando os altos feitos da guerra de Troia acompanhado da sua lira, não poderia ser o próprio Homero? Os aedos, movendo-se num mundo de que a escrita viera a desaparecer, faziam-no para nobres que, muito embora igualmente iletrados, não deixavam por isso de ser os detentores do poder e da riqueza.

Sobre livros e textos
Para uma reflexão mais refinada sobre a centralidade da tradição oral no contexto grego é indicada a leitura do capítulo “Pela boca e pelo ouvido”, in: A Invenção da Mitologia, de Marcel Detienne.
O artigo “O Narrador”, de Walter Benjamin, analisa a extinção progressiva da experiência de narrar. A difusão do saber oral, distante espacialmente ou temporalmente, não carece da confirmação através da experiência, diferentemente do que acontece com a informação. A Autoridade do saber não está no testemunho nem nas provas factuais, e sim na crença que o cerca. Walter Benjamin parece nostálgico ao afirmar que a Modernidade inaugura a substituição da narrativa pela informação.

Um pouco da História dos deuses
Vamos tentar localizar a mitologia no interior da sociedade grega, ou seja, compreender o que ela representa para os gregos.
Os gregos eram politeístas: acreditavam em diversos deuses. Os deuses tinham uma importância central na sua história, eram vistos como senhores da terra e do céu, habitantes do Monte Olimpo. Os deuses eram todos antropomorfos: tinham forma, sentimentos, virtudes e fraquezas humanas. Além da crença nos deuses, as almas dos antepassados também eram cultuadas pelas famílias, através de uma série de rituais que ficavam a cargo das mulheres.
Zeus, o chefe supremo da família dos deuses, casou-se com Hera. Desse casamento nasceram novos deuses, cada qual personificando um elemento ou um fenômeno da natureza: Hermes era a chuva e também o mensageiro dos deuses; Apolo, um jovem muito belo, personificava o sol; Artêmis era a deusa da lua, representada como caçadora; Deméter era a terra fértil, que produzia as colheitas e alimentava os homens; Perséfone era a semente; Dionísio o deus das vinhas.
A todos esses deuses ofereciam-se sacrifícios de animais, cerimônias, festas e jogos. Os jogos mais famosos da Grécia, as Olimpíadas, realizavam-se de quatro em quatro anos na cidade de Olímpia, em homenagem a Zeus. Ali, atletas de todas as cidades gregas participavam de várias competições: salto, corrida, luta, arremesso de dardo e de disco. O atleta vencedor, quando voltava à sua cidade, recebia honras de herói, ficava livre do pagamento de impostos e tinha um lugar especial nas festas públicas. Todos os atletas competiam completamente nus. O espetáculo dos jovens se movimentando era apreciado pela beleza. Entretanto, as mulheres não participavam dos jogos olímpicos. Estes eram tão importantes para os gregos que durante sua ocorrência as guerras deixavam de acontecer. Os gregos também contavam o tempo pela Olimpíada. A primeira Olimpíada ocorreu em 776 a. C., data considerada o ano 1 da Grécia Antiga.

Primeira atividade
Sugerimos que você institua 15 minutos de Mitologia por aula. Reúna os seus alunos numa roda no pátio da escola e conte um mito. Você pode começar pelo mito do Minotauro, que retrata a origem do mar Egeu e se relaciona com a própria origem da Grécia.
Quando acabar, peça aos seus alunos que recontem o mito, oralmente. Depois, é o momento de perguntar se ele foi contado de maneira idêntica à primeira narração (feita por você). Ao perceber que houve algumas diferenças no recontar, temos a brecha para discutir a construção da memória, que pressupõe seleção, idealização e a própria História enquanto representação...
A experiência pode ser repetida durante todo o período em que está sendo discutido o tema Grécia Antiga.
Sugerimos, como segundo mito a ser contado, o Mito de Perseu, que se tornou o rei de Micenas, importante cidade-estado da Grécia Antiga. Desta vez, além da experiência do recontar, a atividade pode incluir o registro escrito da versão dos alunos, que pode acontecer na forma de uma narrativa convencional ou em outros formatos sugeridos por eles, como história em quadrinhos. No caso do público ser de 5ª série isso significa um espaço lúdico muito estimulante, além de proporcionar a concretização da História através dos desenhos.
Na segunda parte da oficina, vamos propor uma atividade em torno da Odisseia, de Homero.

A odisseia de Homero
Trabalhando os Tempos Homéricos na Grécia Antiga
Quatro séculos depois do desaparecimento da Civilização Micênica, algumas histórias foram reunidas por um poeta grego chamado Homero. Segundo a lenda, Homero seria um aedo cego que, devido a essa deficiência, teria o dom de ver o mundo sobrenatural.
Os registros de Homero deram origem a duas obras que são as mais importantes fontes de conhecimento do mundo grego: a Ilíada e a Odisseia. Ainda hoje, há quem discuta se os dois livros são obra do mesmo poeta e se de fato Homero teria existido. Fusões de fatos históricos com mitos gregos, a primeira retrata a Guerra de Troia e a segunda conta a história de Odisseu (ou Ulisses), rei de Ítaca, e sua dificuldade de retornar à ilha após sua participação na Guerra de Troia.

Guerra de Troia
A história da Guerra de Troia se relaciona de maneira estreita à própria história do retorno de Ulisses a Ítaca. Ulisses, como rei de Ítaca, teria sido chamado a colaborar no resgate de Helena, mulher de Menelau, rei de Esparta.
Troia era uma cidade grande, fortificada e muito rica. O rei desta cidade, Príamo, teve muitos filhos, entre eles Páris, que segundo um oráculo iria colocar fogo em Troia. O rei, ao saber o que os oráculos previam, resolveu abandonar o menino numa montanha próxima, onde ele seria devorado pelos lobos. O menino acabou sendo resgatado por um casal que se responsabilizou por sua criação.
Anos mais tarde, na morada dos deuses, o Olimpo, houve uma grande festa. Quase todos os deuses foram convidados, com exceção de Éris, deusa da discórdia, para evitar que ela levasse conflitos para a festa. Éris entrou na festa e lançou sobre a mesa um bilhete onde estava escrito "A mais bela!". As deusas do Olimpo eram extremamente vaidosas e por isso começaram a competir para ver quem era a mais bela. Por fim permaneceram apenas três deusas na competição, Hera, a esposa de Zeus, Palas Atena, que havia saído da cabeça de Zeus, e Afrodite, filha de Zeus.
Como Zeus não queria se incumbir do desempate, convenceu as candidatas a chamarem um mortal, Páris, filho de Príamo, o poderoso rei de Troia, para decidir. As deusas resolveram subornar o mortal oferecendo poder, sabedoria e a mulher mais bela do mundo. Esta dádiva havia sido oferecida por Afrodite e foi aceita imediatamente por Páris. A mulher mais linda da terra era Helena, casada com Menelau, rei de Esparta. Páris, ajudado por Afrodite, sequestrou Helena, levando-a para Troia.
Quando Helena foi sequestrada, Menelau apelou a todos os reis da Grécia para que o ajudassem a resgatá-la. Formou-se então um enorme exército, pois cada rei levou seus soldados. E todos, chefiados por Agamenon, que era irmão de Menelau, dirigiram-se a Troia para buscar Helena de volta. A guerra durou dez anos, porque os deuses ora ajudavam os gregos, ora ajudavam os troianos.
Entre os reis gregos que sitiaram Troia estava Ulisses, o mais astuto de todos. Este planejou a construção de um cavalo de madeira e no interior dele acomodou os guerreiros valentes. O cavalo foi colocado nos portões de Troia, como se fosse um presente. Os soldados dissimularam sua saída fazendo os troianos acreditarem que a guerra havia acabado e que o presente era uma prova disso. O cavalo era tão grande que foi preciso derrubar uma parte da muralha para colocá-lo ali dentro.
Todos os troianos beberam para comemorar, ficaram muito cansados e foram dormir. Nesse meio tempo os gregos que estavam no interior do cavalo saíram e se juntaram aos soldados que atravessaram a brecha aberta na muralha. Os gregos se espalharam pela cidade matando os troianos e libertando Helena, que foi levada de volta para Esparta.

Contando e recontando a Odisseia
É importante que a Odisseia não apareça num registro escrito, embora saibamos da existência de várias versões escritas para a obra. A grande questão é promover uma vivência, realizar com os alunos uma experiência oral. Reúna os alunos numa roda, no pátio externo da escola ou mesmo na sala, e procure contar a História da Odisseia numa linguagem bem acessível. Após esse momento peça para os alunos para recontar a História. Certamente eles levantarão questões sobre as dificuldades de memorizar todos os detalhes da história. O importante não é decorar os detalhes mas é lembrar do processo como um todo e recontar para os outros acrescentando ou diminuindo, acima de tudo selecionando informações.
A atividade pode levar a uma reflexão sobre as diferenças entre o registro escrito e a história contada oralmente. Além disso, o fascínio que as aventuras de Ulisse certamente despertarão ajuda a aproximar as crianças do universo mítico e da organização social da Grécia Antiga.
O resultado final dos encontros para contar e recontar a Odisseia pode assumir diversas formas: apresentações teatrais (o que abriria a oportunidade de estudar as origens do teatro grego), histórias em quadrinhos, um mural ilustrado, entre outras possibilidades.
Caso os alunos estejam motivados, vocês podem pesquisar outros mitos gregos e prosseguir com a atividade de contar e recontar indefinidamente, o que em muito contribuirá para a capacidade de memorização, expressão, leitura e escrita dos alunos, além de abrir caminho para o trabalho de inúmeros outros temas, como a cidadania, a política, a filosofia, a arte, etc.
Vamos agora conhecer a Odisseia.

Odisseia - A disputa dos pretendentes
Dez anos após o término da Guerra de Troia, os soldados, generais e comandantes já haviam retornado para casa. Só o guerreiro Ulisses não conseguia retornar à ilha de Ìtaca, onde lhe esperavam sua mulher Penélope e seu filho Telêmaco, já com 20 anos. Os deuses faziam de tudo para adiar esta volta ou mesmo impossibilitá-la. Palas Atena, ao perceber que Hélio (Deus do sol) e Poseidon (Deus das águas) estavam envolvidos na elaboração de obstáculos que visavam impedir a viagem de Ulisses, resolveu fazer uma reunião no Olimpo para discutir o caso. Chegando a um consenso com alguns deuses, inclusive Zeus, resolveu ajudar Ulisses a voltar para casa.
Palas Atena dirigiu-se a Ítaca para ajudar Telêmaco, que tinha que afastar os inúmeros pretendentes de Penélope, mulher de Ulisses, dado como morto pelos pretendentes que estavam de olho no trono de Ítaca e na sua bela mulher. A deusa disfarçou-se de Mentes, rei dos Táfios, e entrou no palácio logo após uma grande comilança realizada pelos pretendentes.
Telêmaco estava cansado de sustentar os pretendentes com banquetes. Palas Atena transmitiu ao filho de Ulisses a certeza de que o pai estava vivo e disse-lhe que ele deveria divulgar isso aos príncipes para convencê-los sobre a necessidade de buscá-lo. Telêmaco dirigiu-se aos habitantes de Ítaca na ágora para comunicar que precisava da ajuda de todos para resolver um problema que o afligia. Descreveu a situação que estava vivendo: os pretendentes de sua mãe não saíam de sua casa, não paravam de consumir seus rebanhos e vinhos.
Os pretendentes, por sua vez, ouviram a queixa e acusaram Penélope de adiar a escolha com o pretexto de terminar um manto para o seu sogro. Essa costura já levava 4 anos e não se concluía porque Penélope desfazia tudo que costurava durante a noite. Sendo assim, os pretendentes afirmaram que permaneceriam na casa de Ulisses até sua mulher decidir aceitar um dos homens. Exigiam que Penépole voltasse para a casa de seu pai, e de lá sairia com um dos pretendentes. Telêmaco respondeu que não podia mandar sua mãe embora, e que eles é que tinham que sair da casa, que fossem banquetear-se uns na casa dos outros. Se continuassem com essa atitude, ele iria pedir a Zeus que os castigasse.
Haliterses, um velho herói que costumava fazer profecias, dirigiu-se especialmente aos pretendentes e contou que Ulisses, que ficou tanto tempo fora, estava voltando e que o herói deveria estar tramando vingança contra os que tentaram tomar-lhe a mulher e arruinar sua casa. "Quando Ulisses partiu, eu previ que ele levaria vinte anos para voltar. Minhas profecias vão se cumprir agora."
Ao perceber a ira dos pretendentes, Telêmaco tomou a iniciativa de reunir uma embarcação com tripulação, para que pudesse dirigir-se a algumas cidades próximas, pois ele ainda queria tentar saber notícias de seu pai. Nesse momento Telêmaco pediu ajuda a Atena, que seria sua protetora. Atena prometeu ajudá-lo. O filho de Ulisses resolveu manter segredo sobre sua ida.
Atena, disfarçada de Telêmaco, disponibilizou um barco com remadores, fez com que os pretendentes dormissem pela cidade e embarcou sua tripulação.
Mal amanheceu, o barco já se encaminhava para Pilo, onde havia uma grande festa em que animais eram sacrificados em honra dos deuses. Os sacrifícios eram sujeitos a regras, o jeito de matar os animais, os pedaços que deviam ser servidos, tudo isso era dedicado aos deuses. Telêmaco e Atena se apresentaram e justificaram sua presença ali para buscar notícias de Ulisses. Nestor, o rei do lugar, contou a Telêmaco sobre as dificuldades que os participantes da guerra estavam encontrando para voltar, e sugeriu que este fosse a Esparta (Lacedemônia) encontrar Menelau, que talvez tivesse notícias de Ulisses. Foi o que fez Telêmaco.
Menelau contou-lhe que, através de contatos com Proteu, servo de Poseidon, soube que Ulisses estaria vivo, preso na ilha da ninfa Calipso, sem navio e companheiros, sem poder voltar ao mar. Enquanto isso, em Ìtaca, os pretendentes ficaram furiosos quando souberam da viagem de Telêmaco. Eles tramavam uma cilada para Telêmaco quando um arauto fiel de Penélope escutou toda a conversa e resolveu contar à rainha.

Odisseia - As dificuldades do retorno de Ulisses
Os deuses estavam reunidos discutindo o destino de Ulisses. Atena saía em sua defesa dizendo o quanto ele tinha sido bom para todos em Ítaca, e que não era justo que ele encontrasse dificuldades em voltar para casa. Zeus então mandou um recado para que Ulisses fosse libertado. Esse recado seria mandado por Hermes. Calipso então comunicou a a Ulisses que ele deveria construir uma jangada e partir. Deu-lhe ainda o linho para confeccionar a vela e, quando a jangada ficou pronta, colocou nela vinho e alimentos. Ulisses levantou a vela e, com os olhos nas estrelas que o guiavam, partiu. Ulisses navegou dezessete dias. No décimo oitavo dia, divisou os montes da costa da terra dos Feácios. Mas Poseidon, que neste momento vinha voltando da África, onde tinha ido receber um sacrifício, de longe conseguiu enxergar a jangada de Ulisses. Já sabemos que Poseidon tinha horror a Ulisses. Chamou então as nuvens e os ventos e com o tridente agitou o mar. Em poucos minutos fez cair uma tempestade terrível.
Entretanto, do fundo do mar uma deusa chamada Leocótea viu o que estava acontecendo e teve pena do nosso herói. Tomou a forma de uma gaivota, decerto para não ser vista por Poseidon, e pousou numa trave da jangada. Disse então a Ulisses que despisse a roupa que ele vestia, pois estava muito molhada e pesada, pusesse no peito um manto que ela lhe emprestou e então se atirasse na água e nadasse até a terra.
Ulisses tinha chegado à terra dos Feácios, cujo rei era Alcino. Por manipulação dos deuses, Ulisses acabou protegido por Nausícaa, filha do rei. Ulisses foi recebido no palácio com as honrarias de um visitante. As escravas lavaram suas mãos e lhe ofereceram bebidas e comidas. Alcino, como todos os gregos naquela época, sempre que via um estrangeiro ficava imaginando se ele não seria um dos deuses, e por isso o tratava muito bem. Mas Ulisses disse que não passava de um mortal e que seu maior desejo era voltar para casa. Prepararam um leito para Ulisses e foram todos dormir.
No dia seguinte, Alcino convocou a população para ajudar a montar um navio para embarcar Ulisses, que omitia sua identidade. Quando houve a realização dos jogos e posteriormente as comemorações, o aedo começou a contar a história do cavalo de Troia, o que acabou emocionando muito Ulisses. Ele então foi questionado sobre o porquê da comoção, e resolveu contar sua história.
Contou que era Ulisses, filho de Laertes e rei da ilha de Ítaca, aquela que se avista de longe. Contou como lutou em Troia, ao lado do exército grego. Após algumas vitórias a sorte mudou, eles foram derrotados e tiveram que fugir nos navios. Acabaram chegando num lugar muito estranho onde as pessoas comiam flores de lótus e eram chamadas de lotófagas. Essas flores provocavam uma sensação tão grande de felicidade que alguns homens, depois de comê-las, acharam ótimo e não quiseram mais ir embora. Ulisses mandou prendê-los dentro dos navios e tratou de sair daquele lugar.
Passaram pela ilha dos Cíclopes, gigantes enormes de um olho só que viviam em cavernas sem que precisassem plantar nada, pois tudo crescia nesse lugar. Ulisses resolveu se aproximar de uma caverna habitada por um Cíclope. Quando o gigante apareceu, trazia seu rebanho e um enorme feixe de lenha que arremessou no chão apavorando os homens de Ulisses. Este clamou pela clássica hospitalidade dos gregos aos estrangeiros. O Cíclope ironizou o pedido de hospitalidade dizendo-se mais forte do que os deuses e perguntou onde estava a nau que os trouxera. O gigante devorou dois marinheiros e atirou-os ao chão além de prender os companheiros de Ulisses numa caverna. Quando amanheceu, o gigante acordou, acendeu o fogo, ordenhou suas ovelhas e cabras e agarrou mais dois homens e os devorou. Ulisses então pensou num plano para matar o Cíclope. Descobriu num canto um tronco de oliveira que estava secando. Cortou um bom pedaço e pediu aos companheiros que o descascassem. Aguçou a extremidade e endureceu a ponta no fogo. Escondeu então essa arma no meio do estrume que havia no chão. Quando o monstro chegou, fez tudo como tinha feito na véspera, inclusive devorar mais dois homens. Ulisses lhe ofereceu canecas de vinho e disse para o monstro que se chamava Ninguém. O monstro decidiu que graças ao vinho Ninguém seria o último a ser devorado. O Cíclope estava bêbado e dormiu profundamente. Ulisses e seus homens desenterraram com força o espeto, colocaram-no no fogo até que ficou em brasa. Então, todos juntos, enterraram-no no olho do Cíclope. O gigante começou a berrar de dor e a chamar todos os gigantes da ilha para que o socorressem. Quando o Cíclope se referiu a Ninguém como o responsável pelo ataque, seus companheiros não entenderam nada. O monstro, louco de dor, retirou a pedra que fechava a gruta e sentou-se na saída, estendendo os braços em todas as direções para que nenhum deles fugisse. Ulisses amarrou as ovelhas e as cabras de três em três e debaixo de cada grupo de animais prendeu um de seus homens. Foram todos saindo até o navio. Além de assumir ter sido ele o responsável pelo ferimento do Cíclope, Ulisses gritou que este havia abusado da hospitalidade devorando seus homens e que Zeus o faria pagar por seus pecados. O gigante respondeu dizendo já saber da antiga profecia de que perderia a visão por culpa de Ulisses. O gigante pediu a Poseidon que não permitisse a volta de Ulisses, mas os deuses intercederam a favor do herói.
Depois de navegar durante alguns dias, os viajantes chegaram a Eólia, ilha flutuante onde morava Éolo, guardião dos ventos, e sua grande família. Ulisses e seus homens foram muito bem recebidos e lá ficaram durante um mês. Quando resolveram partir, Èolo deu a Ulisses um enorme odre de couro onde estavam guardados todos os ventos perigosos, para evitar que a viagem fosse mais retardada ainda. Enquanto Ulisses dormia, seus companheiros, desconfiados dos segredos que Ulisses guardava, resolveram abrir o odre. Liberados, os terríveis ventos causaram uma tempestade que levou o navio novamente para a ilha Eólia. Desta vez, Éolo os expulsou alegando que não daria ajuda a homens detestados pelos deuses.
Passaram pela ilha dos Lestrigões, depois pela ilha Eeia, onde vivia uma misteriosa feiticeira dotada de linguagem humana, Circe. O contato de Ulisses com Circe durou um ano. Circe disse a Ulisses que antes de voltar a Ítaca ele deveria ir ao inferno consultar o cego Tirésias, único morto a quem Perséfone consentia que visse o futuro dos homens. Ulisses deveria interrogar Tirésias para saber o que lhe iria acontecer. Ulisses ficou temeroso com essa visita, apesar de Circe ter dado todas as coordenadas de como deveria agir. Todo o ritual foi feito. O adivinho apareceu, reconheceu Ulisses e fez as previsões para o futuro. Estas apontavam para as dificuldades no retorno à casa porque Poseidon estava furioso com Ulisses por este haver cegado Polifemo, filho de Poseidon.
O cego afirmou: "Tu e teus companheiros poderão chegar à pátria se não perturbarem os bois e os carneiros de Apolo, o Sol. Mas, se maltratarem os animais dele, embora tu escapes da morte, vais prender todos os seus companheiros. E vais chegar a teu lar em navio estranho e em tua casa encontrarás problemas."
Terminada a divulgação da profecia, Ulisses e seus homens retornaram à ilha de Circe. Embarcaram e se aproximaram da ilha das sereias. As sereias eram criaturas que atraíam os marinheiros com suas vozes maravilhosas. Todos os que passavam perto delas acabavam se atirando ao mar, enlouquecidos pelo seu canto, e morriam afogados. Ulisses amassou com as próprias mãos uma boa porção de cera, que foi amolecendo graças com a ajuda do calor do sol. Tapou com a cera os ouvidos dos marinheiros. Mas antes pediu-lhes que, depois que estivessem com a cera no ouvido, amarrassem Ulisses bem forte no mastro, já que ele não teria vedado os ouvidos.
Após essa provação, Ulisses teve que passar pelos rochedos de Cila e Caríbdes. Entre as rochas havia uma caverna habitada por um monstro de seis cabeças, Cila. Quando passava algum navio, Cila devorava quantos marinheiros pudesse. Remando com vontade acabaram passando pelos perigos das rochas e seu monstro. Logo chegaram à ilha dos rebanhos do deus Hélio. Como sabemos, a profecia de Tirésias indicava perigo caso acontecesse alguma coisa com os animais de Hélio. Devido às tempestades, o barco deveria permanecer um mês na ilha à espera que o vento diminuísse. Os homens começaram a sentir fome e a primeira coisa que imaginaram foi comer a carne de um animal do rebanho sagrado. Quando Ulisses acordou o mal já estava feito. Os deuses se vingaram enviando ventos, varrendo os instrumentos de navegação, quebrando os cabos do mastro, ferindo o piloto e atirando todos os homens para fora do navio, com exceção de Ulisses. O navio foi se partindo e por fim havia apenas um pedaço da quilha, ao qual Ulisses atou o que sobrava do mastro. Sentou-se sobre esses restos e deixou-se arrastar pelos ventos furiosos. Durante toda a noite vagou no mar até chegar à ilha Ogígia, onde morava a ninfa Calipso. Foi mantido prisioneiro na ilha durante sete anos.

Os Oráculos
Entre os gregos havia templos dedicados aos vários deuses, e em alguns deles existiam oráculos, sistemas de interpretação da sabedoria dos deuses, que se comunicavam com os homens que vinham pedir conselhos ou saber do futuro. Muitas vezes a consulta não era pessoal, envolvia uma cidade inteira, sobretudo em épocas de guerra ou de peste.
A consulta ao oráculo era uma ocasião solene, como uma visita ao próprio deus, e exigia vários rituais. Além dos oráculos, os gregos acreditavam em presságios, sinais significativos que eram interpretados como um aviso dos deuses, como o voo das aves, que em certas ocasiões eram identificados como bons ou maus. Na Guerra de Troia, por exemplo, os troianos foram intimidados por uma águia que voava com uma serpente nas suas garras, ensaguentada, ainda viva, que picou a ave perto do pescoço, e eles acreditaram que a visão era um presságio de Zeus.

Bibliografia
BENJAMIN, Walter. O Narrador: Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: Obras escolhidas - magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BRANDÃO, Junito S. Mitologia Grega, vols. I,II e III. Petrópolis: Vozes, 1987.
COMMELIN, P. Mitologia Grega e Romana. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
DETIENNE, Marcel. A Invenção da Mitologia. Rio de Janeiro: José Olympio/UnB, 1992.
ELIADE, Mircea. História das crenças e das ideias religiosas, tomo 1, vol.2. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
FINLEY, M. I. Aspectos da Antiguidade. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
________ . Grécia Primitiva: Idade do Bronze e Idade Arcaica. São Paulo: Martins Fontes,1990.
_________ . O Mundo de Ulisses. Lisboa: Presença, 1972.
GRIMAL, P. A Mitologia Grega. São Paulo: Brasiliense, 1987.
__________ . Dicionário de Mitologia Grega e Romana. Lisboa: Difel, 1993.
JONES, Peter V. (org.). O Mundo de Atenas. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
KERÉNYI, C. Os Deuses gregos. São Paulo: Cultrix, 1993.
_________ . Os Hérois gregos. São Paulo: Cultrix, 1993.
KURY, Mário da Gama. Dicionário de Mitologia Grega e Romana. São Paulo: Jorge Zahar, 1987.
LAVERDET, Marcel, RAGACHE, Claude-Catherine. A Criação do mundo, mitos e lendas. São Paulo: Ática, 1995.
MOSSÉ, Claude. As Instituições Gregas. Lisboa: Edições 70, 1985.
________ . A Grécia Arcaica de Homero a Ésquilo. Lisboa: Edições 70, 1988.
PRIETO, Heloísa. Divinas Aventuras, Histórias da Mitologia Grega. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1997.
SISSA, G. e DETIENNE, M. A vida quotidiana dos deuses gregos. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
VAN ACKER, Teresa. Grécia, A vida cotidiana na cidade-estado. São Paulo: Atual, 1994.
VERNANT, Jean Pierre. Mito e religião na Grécia Antiga. Campinas: Papirus, 1992.
__________ . Mito e pensamento entre os gregos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
__________ . A Morte nos olhos: figurações do outro na Grécia Antiga: Rio de Janeiro: Zahar, 1988.
VIDAL-NAQUET, Pierre. O Mundo de Homero. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
Biblioteca virtual
· História Antigahttp://www.historianet.com.br/main/assuntos.asp?assunto=2&divisao=7Diversos artigos sobre a História Antiga: mitologia, cidades-estado, a lenda de Osíris, o período Clássico, a Grécia pré-helênica.
· Laboratório de História Antiga da UFRJhttp://www.ifcs.ufrj.br/~lhia/
· Mito, rito e religiãohttp://www.mundodosfilosofos.com.br/mito.htmA parte conceitual é interessante, mostra um panorama das definições de mito, de Jung a Roland Barthes. Aborda a equivalência entre os deuses gregos e romanos e resume a História dos deuses gregos.
· Jogos Olímpicoshttp://www.historianet.com.br/main/mostraconteudos.asp?conteudo=210 Da Grécia Antiga aos dias de hoje.
Sobre esta oficina
Autora: Elisa Goldman, Mestre em História pela PUC-Rio
Ilustrações: Salmo Dansa
Copyright © 2008 Fundação CECIERJ
Todo o material deste site pode ser utilizado desde que citados a fonte e o autor.
Data: Oficina publicada na Revista Educação Pública em 20 de julho de 2001..

Fonte: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/oficinas/historia/mitologia/index.html

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

"Imprensa Marrom"

Matéria sobre a compra da Oi nos sites dos jornais O Dia e O Globo. Acesso: 26/01/2006


O Dia. PT compra parte da Oi por R$ 8 bilhões.



O Globo. Portugal Telecom conclui acordo para comprar parte da Oi.

Como surgiu a expressão "imprensa marrom"?
Ela foi inspirada na expressão americana yellow press ("jornalismo amarelo"), que surgiu no final do século XIX a partir da concorrência entre os jornais New York World e The New York Journal. Eles haviam entrado em guerra para ter em suas páginas as aventuras de Yellow Kid, a primeira tira em quadrinhos da história.
A disputa nos bastidores foi tão pesada que o amarelo do cobiçado personagem acabou virando sinônimo de publicações sem escrúpulos. Em língua portuguesa, a expressão teve sua cor alterada no Brasil em 1959, quando a redação do jornal carioca Diário da Noite recebeu a informação de que uma revista chamada Escândalo extorquia dinheiro de pessoas fotografadas em situações comprometedoras.
O jornalista Alberto Dines, hoje editor do programa de TV Observatório da Imprensa, preparava, para a manchete do dia seguinte, algo como "Imprensa amarela leva cineasta ao suicídio". O chefe de reportagem do Diário, Calazans Fernandes, achou o amarelo uma cor amena demais para o caráter trágico da notícia e sugeriu trocá-la por marrom. "Assim, a expressão ‘imprensa marrom’ originou-se numa denúncia contra a própria imprensa marrom", afirma Dines. Além de criar o novo termo, a manchete do Diário da Noite contribuiu para o fim da criminosa revista Escândalo, fechada logo em seguida.






terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Dicas para a sala de aula

Métodos para Anotar com Precisão Durante as Aulas


Adaptado de artigo por Simone Harnik (São Paulo)

Se você acha que ir à escola e prestar atenção no que o professor diz é suficiente para aprender a matéria, pode estar enganado. A prática de tomar notas vai além de um hábito da turma dos nerds: pode mesmo melhorar o desempenho em testes e facilitar o entendimento do conteúdo.
Segundo Ocimar Munhoz Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo), para haver aprendizagem o fator fundamental é a "interação". "É preciso trocar as impressões da matéria com outras pessoas. Até para que o estudante possa dizer 'você errou'", afirma. O certo e errado, de acordo com Alavarse, é mais bem definido nas disciplinas de exatas. Como nas humanidades, em geral, pode haver muitas versões para um mesmo fato, o debate e a discussão são boas formas de colocar o conhecimento à prova.
Mas para que essa interação seja proveitosa, o especialista da USP afirma que o aluno deve fazer a sua parte. Como? Por exemplo, marcando o que achar interessante para as discussões em suas leituras prévias.
Anotando estamos fazendo sínteses, resumos. E os resumos nos orientam. Se uma palavra aparece muito em um texto, é importante anotá-la, pois ela pode ser carregada de sentido". Depois de separar a palavra, o estudante deve buscar material sobre ela em um dicionário ou em livros da disciplina.
A prática de manter um caderno com as anotações pode facilitar na hora da prova. Pegar o livro ou a apostila para rever todo o conteúdo costuma ser mais demorado do que ler o que você anotou durante a aula ou durante as horas de estudo.
Quando o estudante lê um texto de 20 páginas, tem de ficar com, pelo menos, meia página de anotações daquele texto", diz o especialista. "Esse princípio de anotar é aparentemente simples, mas é decisivo. A escrita é a arte da memória. E o procedimento ajuda ainda mais quem tem muita coisa para estudar."
Já o formato das anotações, segundo Alavarse, depende do estudante. "O importante é construir resumos, resenhas, sínteses. Não importa como vai ser o começo. Cada um aperfeiçoa como pode. Seja no laptop, no papel ou no livro", afirma.


Cinco razões para fazer anotações:
1- Anotar ajuda a memorizar a leitura e as aulas
2- Suas anotações são fontes de dicas do que o professor considera mais importante
3- Tomar notas ajuda a se concentrar na sala de aula
4- Anotações são uma fonte de informação para se preparar para as provas
5- Seu caderno, normalmente, terá informações que não estão em qualquer outro material


Guia para aprimorar suas anotações:
1- Concentre-se na aula ou no material de leitura
2- Anote com consistência; sem preguiça
3- Seja seletivo. Não tente escrever tudo: cada pessoa fala de 125 a 140 palavras por minuto. Quem anota, consegue escrever, em média, 25 palavras por minuto
4- Escreva o que foi dito ou lido com suas próprias palavras
5- Organize as suas anotações
6- Seja breve, escreva apenas os pontos importantes
7- Use letra legível. Anotações não têm valor, se você não puder lê-las!
8- Não se preocupe com a correção gramatical


Cinco Métodos de Anotação
Entre as técnicas, estão procedimentos simples, como numerar as frases, e outros mais complexos, como o método Cornell, que exige a divisão do papel em três partes e dedicação do estudante. As cinco formas de organização são oferecidas aos alunos da Universidade de Stanford, pelo Centro de Ensino e Aprendizado da instituição. (Veja na tabela abaixo cada um dos métodos detalhadamente).
"Aprender a se organizar é fundamental para o aprendizado, porque, se o estudante não se organiza, não vai conseguir pesquisar, ter autonomia", afirma Noely Weffort de Almeida, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
O processo de ensinar a organização na escola pode começar desde cedo, de acordo com Noely. As crianças devem ser estimuladas pelos pais a registrarem no caderno o que aprendem na sala de aula.
Sempre respeitando as diferenças individuais: "É fundamental fazer anotação, mas a forma depende de cada um. A mesma aula pode ser anotada de formas diferentes", diz.
Segundo Alavarse, registrar o que se ouve em aulas e palestras facilita o aprendizado. "O importante é fazer as anotações. Depois, cada um aperfeiçoa o seu método: pode ser no laptop, no papel, no livro", afirma. Para ele, adotar técnicas de anotações é um passo para quem já está habituado a pôr no papel o que o professor diz. Se você não está acostumado a escrever durante a aula, o primeiro desafio é preencher as folhas do caderno.
E vale ficar atento para não deixar que os métodos "engessem" sua criatividade. Eles podem ser combinados, utilizados conforme a disciplina, a aula, o professor e o gosto pessoal.


Para melhor visualização dos métodos é só clicar na imagem.
Fontes:
http://educacao.uol.com.br/ultnot/2009/03/16/ult105u7723.jhtm
http://educacao.uol.com.br/ultnot/2009/05/14/ult105u8023.jhtm
Fonte: http://moodle.edumed.com.br/file.php/1/ComoFazerAnotacoes.pdf. Acesso 18/01/2011.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Entrevista com Carlos Ginzburg



"Google é uma ferramenta de pesquisa histórica e de cancelamento da história porque, no presente eletrônico, o passado se dissolve". (Frase proferida pelo historiador italiano Carlo Ginzburg no Fronteiras do Pensamento, edição 2010).Algumas dessas colocações, do referido historiador na conferência História na Era Google, realizada no dia 29 de novembro em Porto Alegre, causaram-me uma inquietação. A visão do Historiador de prestígio sobre a ferramenta Google e as revolucionárias tecnologias de informação, aproxima a proposta do uso de blogs como ferramenta de memória a uma breve discussão seguida de questionamentos. O uso de blog como ferramenta de memória visa o contrário da afirmação de Ginzburg. Temos, com o uso da tecnologia e das redes sociais, a hipótese de que seja possível manter uma memória social viva, que propicie a coesão e a identidade da comunidade de Viamão, através da construção coletiva do conhecimento. Com o uso de tecnologia como meio de armazenamento, difusão e propagação de informações, lembranças e conhecimento, pode-se ter como resultado, a preservação da memória . Os esforços nessa direção devem partir de um entendimento sobre o Valor da Memória. Le Goff 1988, p.477, infere que a relação memória e história se resume em “salvar o passado para servir ao presente e o futuro. Devemos trabalhar de forma que a memória coletiva sirva para a libertação [. . .] dos homens.” Desta forma, e segundo Ginzburg, na análise sobre o Google, surgem questionamentos, pois estaria o homem prestes a supressão de liberdade em detrimento de tecnologia como o Google? O contexto atual, do uso das tecnologias da informação, estaria confirmando o que Le Goff coloca em sua obra, ou a experiência de construção coletiva do conhecimento do Blog Memória Viamense pode significar uma negação à afirmação de Ginzburg?

REFERÊNCIASLE GOFF, Jacques. Memória. In: História e Memória. Campinas: Ed. UNICAMP, 1994, p. 423-483
Fonte: http://www.memoriaviamense.com/



Entrevista com Carlo Ginzburg: Era Google
Por: Equipe Fronteiras

As artes, as linguagens, os conhecimentos, as cidades, os comportamentos fazem parte da grande memória da humanidade e, por vezes, são objeto de investigações dedicadas e amparadas em métodos. É disso que trata a História: examinar a memória, procurar provas, compreender o passado, resolver dúvidas, encontrar um tipo de verdade.

A História está inteiramente dentro da "Era Google" e o faz ampliando seus poderes em um tempo em que os riscos se ampliam igualmente, sobretudo o risco de fraudes e manipulações, tão fáceis com os meios digitais disponíveis.A preocupação com a pesquisa, a fraude, a ficção e a verdade histórica marcaram a conferência de Carlo Ginzburg, História na Era Google, no último encontro da edição 2010 do Fronteiras, dia 29 de novembro.

Carlo Ginzburg é autor de muitos livros de história e um dos pioneiros na chamada micro-história – corrente historiográfica que contempla temáticas ligadas ao cotidiano de comunidades específicas, situações-limite e biografias que se constroem em pequenos contextos ou através de personagens extremos, geralmente figuras anônimas, que passariam despercebidas. Como historiador, Carlo Ginzburg se preocupa com o papel que a História tem em examinar fontes, evidências e teses e em denunciar os vários tipos de manipulações da memória histórica.

Ginzburg tem refletido sobre a História no contexto atual e futuro, cenário que ele chama de "Era Google". Vejamos algumas de suas preocupações ao estudar, refletir, escrever e ensinar a História em uma época em que páginas de busca da internet oferecem respostas sobre quase tudo, mas sem que se garanta a credibilidade imediata da maioria destas fontes.

Confira a entrevista de Ginzburg concedida ao Prof. Dr. Francisco Marshall para o Fronteiras do Pensamento:

FP – Quais são os desafios da Era Google?

Carlo Ginzburg – A web apresenta muitas fontes. As novas tecnologias, como o Photoshop, podem criar um novo tipo de falsificações ou semifalsificações. Sempre existiram falsificações, os historiadores deveriam estar familiarizados com elas, deveriam detectar como cada época cria suas falsificações e as utiliza como documentos históricos. Deveríamos estudar tanto os pontos de falsificação em si quanto aquilo que o falso finge ser. A tecnologia vai produzindo diferentes tipos de fraudes. Passamos da imprensa a fotografias, ao cinema e logo à internet. Mas, assim como há um novo espaço para fraudes, há, também, um novo espaço para se detectar estas fraudes.

FP – E quando as pessoas referem que "está na internet" como sinônimo de fonte confiável?Carlo Ginzburg – Mas isso já ocorria antes, com os livros. Há uma expressão italiana parlare come un libro stampato (falar como um livro ilustrado). É um tipo de autoridade associada à escrita, em contraposição à visão dos sentidos. Devemos ensaiar novos usos da web, como de qualquer outra fonte, sabendo que nem tudo é verdade.

FP – Que tipo de transformação pode acontecer com a memória humana diante da capacidade, cada vez maior, dos suportes de armazenamento?

Carlo Ginzburg – Devemos distinguir entre a memória como armazenamento e a memória da experiência vivida. A internet expande a primeira além da imaginação. Mas como fica a segunda? Estou observando alguns estudos de caso para responder a essa pergunta.

FP – Em que sentido os novos recursos tecnológicos podem contribuir com os estudos da micro-história?

Carlo Ginzburg – Eu acredito que eles contribuem. Internet é uma tecnologia – um instrumento neutro, que pode ser usado para fins muito diferentes, incluindo a micro-história e a abordagem analítica das provas. Ao contrário do que se possa pensar, a internet não é autosuficiente. Ela demanda tecnologias mais antigas como os livros, as bibliotecas, as relações interpessoais cara a cara e a relação professor-aluno. Todos nós dependemos de algum tipo de interação entre o Google e as bibliotecas. Então o problema é como ir além disso. Rejeitar o Google seria absurdo, assim como rejeitar as bibliotecas seria ainda mais absurdo. O desafio é atravessar ambos. O problema é “como”, pois a combinação me parece inevitável.