Vida de professor da rede pública

Súplica Cearense

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Mitologias I

Série: Mitologia
HADES
Iniciaremos a nossa série sobre mitologia greco-romana com a imagem, que aparece, no perfil do Blog, que é Hades. Nas próximas semanas postarei mais sobre esse deus mitológico.



Hades, o tenebroso rei das regiões infernais, era uma divindade sombria, temida e odiada pelos mortais. Irmão de Zeus, recebeu como quinhão o Tártaro, a trevosa região embaixo da terra. Também lhe chamavam Ais, Aidoneus e Plouton. Acredita-se que Ais originalmente designasse a terra dos mortos, e sua etimologia é o indo-europeu - "lugar de encontro, reunião". Os Cíclopes (Kyklopes) fizeram para ele um capacete com o poder de torná-lo invisível, e assim poder vigiar melhor os mortais. Como senhor das profundezas da terra, lhe era atribuído o poder sobre as sementes e as raízes, ou seja, a riqueza agrícola. Daí vinha o nome eufemístico com que era chamado, Plouton, o “Rico”. Como a figura de um temido e inflexível rei do mundo dos mortos demonstra claramente influências asiáticas, talvez mesopotâmicas, é possível que sua forma original fosse a de um mero deus protetor dos grãos. É possível que os gregos tivessem trazido consigo o culto indo-europeu de um primitivo Rei dos Mortos, que fora também o primeiro homem, e portanto, o primeiro morto (há muitos paralelos com lendas indianas, iranianas e romanas). Vestígios deste “rei dos ancestrais mortos” aparecem na do mundo, e com sua tristeza, toda a natureza começou a minguar. Core, por já ter comido uma semente de romã no reino de Hades, não pôde mais deixar o Inferno. Como Demeter ameaçava fazer a natureza perder sua força, Zeus obteve um acordo conciliatório: Core passaria metade do ano com sua mãe na terra, e a outra metade com seu marido no Tártaro, tornando-se conhecida como Perséfone.Segundo Hesíodo, uma bigorna jogada do Céu demora dez dias para atingir o chão, e precisaria de mais dez dias para chegar ao fundo do Tartaros. Lá estavam as almas dos mortos, que vagavam como fantasmas incorpóreos, se alimentando do sangue das vítimfigura cretense de Minos, considerado como juiz dos infernos. Sob a influência das religiões pré-helênicas, acabou ofuscado por Hades.Hades aparece muito pouco na mitologia, e tem pouquíssimos mitos próprios. Destes, o mais importante é o rapto de Perséfone. Desejoso de ter uma rainha , Hades conseguiu com o auxílio de seu irmão Zeus, raptar Kore, sua sobrinha, filha do senhor do Olympos com Demeter. Esta, desesperada com o sumiço de sua filha, procurou-a por todas as partesas que seus parentes sacrificavam em seu nome.
Era no Tártaro que vivia Styx, ninfa filha do Okeanos que personificava o rio infernal do próprio nome. Era em nome de suas águas que os deuses deviam jurar, e por isso era muito temida. Se um deus cometesse perjúrio, ficava impedido de se alimentar de néctar e ambrosia. Perdia as forças lentamente e teria de se afastar dos outros deuses durante dez anos.

Tróia IV

Como é que uma guerra travada há mais de 3250 anos atrás ainda pode despertar o interesse do Ocidente? Pois é um fato que o sitio, a pilhagem e o incêndio da poderosa cidade de Tróia, situada na costa oriental do Mar Egeu, talvez tenha sido aquela que, até os dias de hoje, mais atenção despertou de poetas, historiadores, arqueólogos, pensadores e, no nosso século, de cineastas.
Os gregos antigos consideravam-na o mito fundador da unidade cultual deles, porém muitos outros, ao longo dos séculos que se seguiram ao fim do Mundo Clássico, acreditaram que a Guerra de Tróia não passara de um fantasia épica imaginada por um poeta de gênio: Homero (que teria nascido na Grécia Jônica no século VIII a.C.). Seja como for, a história da saga da tomada de Tróia, seus heróis e heroínas, profetizas e deuses, nunca deixou de fascinar aqueles que dela se aproximaram com atenção e curiosidade.
As razões materiais da Guerra de Tróia
Estrategicamente bem localizada, não muito distante do Estreito do Helesponto (hoje Dardanelos), Tróia ou Ílion, como também era conhecida, era um importante centro comercial na Idade Média do Bronze da Era Minóica. Provavelmente sua população original era formada por hititas, visto que naquele tempo eram eles quem ocupavam a atual região da Anatólia turca. Se o continente pertencia ao Império Hitita, povo famoso por ter forjado o ferro, o Mar Egeu à frente dela pertencia à Talassocracia (Talasso = mar, cracia = governo) dos Minóicos, uma antiga e bela civilização que antecedeu a dos gregos.
As escavações arqueológicas mais recentes (as primeiras começaram em 1871), feitas no sítio de Hissarlik, onde se presume que a lendária Tróia tenha sido erguida, datam a fundação dela ao redor do ano de 2.250 a.C. A confirmar-se isso, é de supor-se que ela tenha sido submetida a sitio e destruída pelos heróis gregos mais ou menos mil anos depois disso: entre 1260 a 1250 a.C.
As razões materiais da guerra até hoje são controversas. Sendo uma cidade rica, os tesouros dela (os fabulosos “tesouros de Príamo”, rei da cidade) devem ter atraído a cobiça dos gregos. Possivelmente importaram outros motivos também. Por ser passagem obrigatória dos navios carregados de trigo que vinham do Mar Negro em direção à Grécia, Tróia cobrava tributos por cada barco que singrasse pela sua costa.
Isto, por igual, deve ter irritado os reis gregos que, dados à pratica da pirataria, viram no incidente do rapto de Helena, a rainha de Esparta, motivo suficiente para submeter a famosa cidade à pilhagem. Para o filósofo Hegel, a Guerra de Tróia teve para o gregos antigos o mesmo significado que as Cruzadas para a Cristandade Medieval.
Origem lendária da Guerra de Tróia
Tudo teria começado, a guerra que se estendeu por dez anos, na festa de casamento do rei Peleu, um humano, com Tétis, uma das tantas deusas do mar. Tendo o centauro Quirón oferecido o banquete de núpcias, todos os deuses do Olimpo foram convidados. A exceção, aliás, justificada, foi não terem avisado a Eris, a deusa da Discórdia, excluída do rol dos presentes a festa. Em vista disso, para vingar-se, insinuando-se entre os convivas, ela jogou entre eles uma bela maça de ouro. Nela havia uma inscrição: “à mais bela”. De imediato três deusas lá presentes, Hera, Palas Atenas e Afrodite, quiseram ficar para si com o fruto dourado.
O todo-poderoso Zeus, não querendo envolver-se na celeuma, recomendou às três concorrentes que fossem até o Monte Ida, nas proximidades de Tróia, e pedissem ao jovem Paris, o pastor local (porém filho do rei Príamo), que servisse como árbitro da contenda. Num repente as três deusas apareceram em frente a ele. Que ele logo se decidisse. Cada uma delas prometeu-lhe algo: Hera acenou-lhe com conquistas militares, Atenas com a sabedoria, enquanto Afrodite, a deusa do Amor, prometeu colocar-lhe nos braços a mulher mais bela do mundo: Helena rainha de Esparta. E foi assim que o destino futuro de Tróia foi traçado, visto que a sentença de Páris foi a favor de Afrodite.
Tempos depois, encontrando um pretexto para viajar para Esparta, Paris visitou Helena, e, aproveitando-se da ausência momentânea do marido dela, o rei Menelau, fugiu com ela para Tróia. Para vingar a ofensa que estendeu-se sobre todos os príncipes gregos - comprometidos com um juramento que haviam feito ao rei Tindaro, pai de Helena, na época em que todos eram pretendentes a casarem-se com ela - , eles, estimulados pelas deusas Hera e Palas Atenas, decidiram armar-se e navegar para os lados da grande cidade do litoral do Egeu oriental para resgatarem-na do leito de Pais, o protegido de Afrodite, e repararem a honra ofendida de Menelau.
A expedição contra Tróia
Atendendo a convocação de Agamenon Atreu, rei de Micenas e irmão de Menelau, 69 reis e príncipes gregos, com barcos e homens, reuniram-se no porto de Àulis na Beócia. Dali esperavam que Bóreas soprassem os ventos favoráveis que os levassem para a guerra. Os guerreiros vieram de todas as partes da Hélade: Peneleu trouxe os beócios, os fócios eram chefiados por Esquédio e Epistrofo, e os lócrios seguiam o valoroso Ajax Oileu. Os abantes eram conduzidos por Elefenor, e Melesteu liderava os atenieses, enquanto Diomedes, guerreiro indomável, arrastava consigo os de Argos.
Os da Lacedemônia, região em situava-se Esparta, eram guiados por Menelau, ao tempo em que Anfimaco e Talpio faziam o mesmo com os epeus. Se Agapeor comandava os arcádios, o astucioso Ulisses, rei de Ítaca, ia à frente dos cefalônicos e Toas na dos etólios. Os das ilhas de Creta e de Rodes obedeciam a Idomeneu e a Tleoponemo, enquanto os mirmidões remavam com Aquiles, o mais bravo dos bravos. Os pardácios navegavam com Protesilau (o primeiro dos gregos a morrer na guerra), e logo em seguida a eles estavam os guerreiros de Ferai e de Metone.
Até o infeliz Filoctetes, arqueiro exemplar, que tentava recuperar-se de um ferimento na ilha de Lenos, fora convocado. Os de Trica, de Argissa, Cifo, aumentavam a expedição, até encerrar-se a relação dos chefes e dos povos com Proto, o comandante dos magnetos. No total perfaziam 1.186 embarcações, carregando no seu bojo 50 mil dos mais valentes dos aqueus (como os gregos se chamavam então).
Todavia, uma ventania atroz impedia a partida deles. O adivinho Calcas, convocado na ocasião, interpretou aquilo como uma artimanha da deusa Artemisa para prejudicar os gregos. A única solução, para aplacar-lhe, seria a oferta de um sacrifício humano. Agamenon, o chefe supremo, então tomou a terrível decisão de imolar a sua filha Ifigênia para que amainasse a tempestade e a expedição pudesse prosseguir. O que foi feito.
O sitio a Tróia e as batalhas dos heróis
Durante os dez anos seguintes os gregos, acampados na planície em frente a Tróia, tentaram tomar de assalto a grande cidade. A resistência do rei Príamo e dos seus filhos, especialmente de Heitor, fizeram os sitiantes amargar desastres. Além disso, receberam apoio de uma série de povos vizinhos que os ajudaram a enfrentar os aqueus, tais como os dardânios, os pelasgos, os trácios, os cícones, os mísios, os frigios, os meônios, os carios e os lícios, num total de 15 integrantes da Liga Assawa (que congregava os troianos e seus aliados), oposta à Liga dos Aqueus.
A aventura do resgate de Helena se transformou assim numa guerra de largas proporções, envolvendo a maior parte das tribos e nações que povoavam a Grécia, os arquipélagos do Egeu oriental e as regiões costeiras da Ásia Menor. Os deuses do Olimpo se dividiram. Uma espécie de guerra civil também eclodiu entre eles. Uns apoiando os gregos outros os troianos, sendo que Zeus, o supremo, procurou manter-se como árbitro para evitar os excessos.
Deste modo, a andromaquia (uma luta entre os homens), misturou-se a uma teomaquia (uma disputa entre os deuses). Entre episódios mil, grande duelos foram travados entre Diomedes e Enéias, entre Pátroclo e Heitor e entre este e Aquiles, o herói máximo dos gregos. Em inúmeras ocasiões, os próprios deuses disfarçados, lançando-se em meio ao choque das espadas, participavam ao lado de um ou do outro campo, protegendo os seus favoritos, sendo que, por isso, o destemido Diomedes chegou até a ferir o próprio Ares, o deus da guerra.
O assalto e a pilhagem de Tróia
Cansados daquele cerco sem fim, que se estendia por quase dez anos, escutando o conselho de Ulisses (orientado por Atena), o mais ardiloso dos combatentes, os gregos simularam uma retirada deixando em frente ao portão central de Tróia um enorme cavalo de madeira. Aparentemente seria uma homenagem deles à inquebrantável resistência dos troianos. Pelo menos assim eles o entenderam. Imprevidentes, não dando ouvidos ao que alertara Cassandra, a profetiza, arrastaram o cavalo para dentro da cidade. Foi o fim de Tróia.
À noite, aproveitando-se de que a população dormia estonteada pelos vapores do vinho sorvido na festa da vitória, Ulisses e um grupo seleto de guerreiros desceu de dentro da barriga do cavalo e, abrindo as portas, permitiu que o restante dos gregos entrasse de surpresa na cidade. Deu-se um massacre. Tróia viu-se pilhada e depois incendiada. Toda a família real sucumbiu. Helena, encontrada em meio as ruínas, foi devolvida a Menelau.
Dividido o botim, os chefes gregos trataram de encher os porões dos barcos com o espólio e inflaram as velas de volta para casa. Mas nem todos conseguiram. Ulisses, o responsável pelo estratagema que levou Tróia à perdição, foi punido de maneira exemplar. Os deuses condenaram-no a deambular pelos mares, envolvido em aventuras incríveis, a enfrentar tempestades e naufrágios, a resistir ao canto das perigosas sereias, a escapar de feiticeiras, a lutar contra o ciclope, façanhas nas quais perdeu as naus, os frutos do saque e todos aqueles seus companheiros que o haviam acompanhado na aventura.
Homero, o poeta cego
A história da Guerra de Tróia alcançou a imortalidade devido a um poeta. Os gregos antigos, ao contrário de muitos especialistas que surgiram depois (como o italiano G.Vico e o filósofo alemão C. Wolf), acreditavam que a soberba narrativa da conquista de Ílion e o que se seguiu, resultou dos versos de um rapsodo cego chamado Homero. Vivendo provavelmente no século VIII a.C., ele costumava peregrinar pelas cortes e pelas ágoras, os mercados públicos das polis daquela época, a repetir em estrofes candentes, entusiastas, cosendo os cantos uns nos outros, os memoráveis feitos dos aqueus (também designados como argivos e danaos), antepassados dos gregos.
Segundo o costume, apresentava-se em pé, apoiado num bastão, narrando de memória em voz alta para que todos ouvissem, preservando assim a memória dos combates dos másculos heróis do passado. Teria sido ele o principal responsável por dar uma unidade cultural a todos o povo do continente da Ática, da península do Peloponeso e das ilhas do Mar Egeu de fala grega. Para Hesíodo, foi Homero quem constituiu a “teologia nacional da Grécia”. É consenso hoje que “nenhum poeta, nenhuma personalidade literária ocupou na vida do seu povo um lugar semelhante” (M.I.Finley, 1972).
Epopéia essa que ele narrou em duas obras distintas: a Ilíada (dedicada ao último ano da guerra) e a Odisséia (a narrativa das peripécias de Ulisses, ocorridas depois da guerra). Neles se encontram não só a relação estreita dos homens com os inúmeros deuses, como também a exposição da cosmogonia grega, o que solidificou a posição dos dois poemas como expressão dos ideais de formação dos nobres gregos (Paidéia). Coube, ao que se sabe, ao tirano ateniense Pisístrato, a partir de 561 a.C., mandar compor por um tal de Zenôdoto, tanto a Ilíada como a Odisséia, na forma tal como hoje se as conhece. No total, os dois grandes poemas subdivididos em 24 cantos cada um, perfazem 27.803 versos, sendo até hoje a mais extensa narrativa épica versificada que a literatura ocidental conheceu.
Outras obras
Personagens da Guerra de Tróia, heróis ou sofredores, ainda serviram de inspiração para muitos autores teatrais nos séculos posteriores a Homero. Os grandes trágicos fizeram inúmeras peças tendo como centro a vida daqueles que participaram da expedição ou foram suas vítimas. Ésquilo, na trilogia “Orestíade” (de 458 a.C.), dedicou a primeira parte dela ao retorno do rei Agamenon à Micenas e a morte que sofreu pelas mãos de Clitemnestra, a sua esposa adultera. Sófocles concentrou-se em dois dos guerreiros que lutaram contra Tróia, “Ajax” (de 445 a.C.), que enlouquecido suicidou-se, e “Filoctetes” (de 409 a.C.), o exímio arqueiro ferido de morte e abandonado por todos.
Eurípides, por sua vez, compôs a peça “Hécuba” (de 424 a.C.) para narrar o sofrimento da rainha de Tróia, a esposa de Príamo que viu os filhos morrerem ou serem vendidos como escravos. Ainda dedicou outra a “Helena”(412 a.C.), duas ao brutal destino de Ifigênia, a filha sacrificada de Agamenon (“Ifigênia em Aulis” e em “Tauris”, 414 e 410 a.C.), e uma outra ainda dedicada aos sofrimentos das mulheres de Tróia (“As troianas”, de 413 a.C.)
Na Idade Média, Renascença e século XX
Coube ao trovador francês Benoit de Saint-Maur, inspirado numa antiga Crônica Troiana escrita por dois autores gregos Dares e Dictis, compor , por volta de 1160, um longo poema intitulado Le roman de Troie (O romance de Tróia), com quase 30 mil versos em pares, dando uma conotação feudal à história do cerco e da conquista da cidade de Príamo. Poema que terá enorme difusão nas cortes daquela época.
Seguindo na trilha de explorar temas da decorrentes da Guerra de Tróia, o escritor italiano G. Boccacio escreveu Il Filostrato, em 1335, e G. Chaucer, o patriarca das letras inglesas, compôs um belíssimo poema de 8 mil versos intitulado Troilus and Criseyde, entre 1372-1386, fonte direta em que W.Shakespeare, já na Renascença inglesa, iria beber para compor a sua peça The History of Troylus and Cresseid”, de 1603. Um drama leve, no qual a situação difícil de Tróia serve apenas de pano de fundo para uma historia de amor não correspondido entre Troilo, um dos filhos do rei Príamo, e a bela Criseida.
No século XX, será o escritor irlandês James Joyce quem, inspirando-se na Odisséia de Homero, irá escrever “Ulisses”, de 1922, romance paradigmático da literatura modernista contemporânea. A épica de Homero ainda ajudou a Derek Walcott, um escritor do caribe britânico, a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura em 1992 com seu poema Omeros, de 1990.
As ruínas polêmicas de Tróia
Desde que as primeiras escavações foram feitas no monte Hissarlik, há bem mais de um século atrás, ocasião em que, entre 1871 e 1890, Henrich Schliemann, o primeiro e maior arqueólogo da Alemanha, revelou ao mundo os seus estupendos achados arqueológicos, as ruínas da antiga cidade de Tróia e seus tesouros (das nove Tróias sobrepostas encontradas, a VII teria sido a destruída por uma guerra) não cessaram de provocar intensas discussões e batalhas verbais entre os arqueólogos e demais especialistas e estudiosos.
Originalmente a Escola Helenística Ortodoxa, de estudiosos ingleses e germânicos, desconsiderava a possibilidade de Tróia ter algum dia existido. Atribuíam tudo à fantasia de um grande poeta. A Escola dita Romântica, todavia, sempre manifestou-se pela existência da cidade de Príamo, dando credibilidade total à narrativa de Homero.
A mais recente delas, dessas refregas de arqueólogos, apelidada pela imprensa alemã de a Nova Guerra de Tróia, ocorrida no primeiro semestre de 2002, envolveu dois acadêmicos respeitados: o dr. Manfred Korfmann, que há anos faz pesquisas em Hissarlik, e seu colega Frank Kolb, um professor de História Antiga, ambos docentes da Universidade de Tubinga.
Korfmann anunciara que “Tróia foi muito importante naquela época. Não só existia a cidade-fortaleza (acrópole) como também haviam os bairros baixos da cidade, que abarcavam uns 270 mil m². Portanto, Tróia era várias vezes maior do que a fortaleza conhecida até agora de 11 mil m².” Devido a sua situação geográfica, ela “ocupava uma posição chave como mediadora entre Ocidente e Oriente”. Tese que originalmente fora sustentada pelo filósofo Hegel, morto em 1831, que nunca pôs os pés naquela região.
Kolb acusou-o de tirar conclusões precipitadas, quando não irreais, das escavações e achados feitos recentemente. Para ele, a Tróia que a arqueologia revelara era um estabelecimento de “terceira classe”, estando bem longe de merecer os adjetivos grandiosos usados por Korfmann, tal como haver descoberto uma “Nova Grande Tróia”. Todavia, dando seguimento as escavações, a tese de Korfmann viu-se reforçada pelos novos achados que parecem assegurar que o perímetro de Tróia era bem mais amplo do que se imaginou originalmente.
Bibliografia
Blegen, Carl W. - Tróia e os troianos, Lisboa, Editorial Verbo, 1966.
Bowra, C.M. - A Experiência grega, Lisboa, Arcádia, 1967.
Brandão, Junito de Souza - Mitologia Grega, Petrópolis, Editora Vozes, 1989, 3 v.
Cook, Robert M . - Os gregos até Alexandre, Lisboa, Editorial Verbo, 1966.
Finley, M.I. - O Mundo de Ulisses, Lisboa, Editorial Presença-Martins Fontes, 1972.
Glotz, Gustave - La Civilización Egea, Barcelona, Editorial Cervantes, 1926.
Homero - A Ilíada e a Odisséia, São Paulo, Difel, 1960.
Jardé, A . - La formación del pueblo griego, Barcelona, Editorial Cervantes, 1926.
Korfmann, Manfred - Troia. Ein historicher Uberblick und Rundgand, Stuttgart, Konrad Theiss Verlag GmbH., 1998.
Lesky, Albin - Historia de la literatura griega, Madri, Editorial Gredos, 1985.
Lloyd-Jones, H. - O mundo grego, Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1965.
Moreno, Cláudio - Tróia, o romance de uma guerra, Porto Alegre, L&PM, 2004
Rostovtzeff, M. - História da Grécia, Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1973.
Sissa, Giulia e Detienne, Marcel - Os deuses gregos, São Paulo, Cia das Letras, 1990.
Steiner, George - Homero em inglês, in Nenhuma paixão desperdiçada, Rio de Janeiro/São Paulo, Editora Record, 2001.
Fonte: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/antiga/2004/05/14/004.htm

Tróia III


Um pouco de humor.
O que causou a guerra de troia?
Várias visões diferentes e factíveis sobre um mesmo assunto, evidenciam a incapacidade de uma única visão (dentre as 6) explicar totalmente o assunto.
Reproduzo aqui o que aprendi na palestra de Reinaldo Gonçalves da UFRJ que ocorreu outro dia lá na faculdade (FCE-UFBA). A tese do professor era que não se pode fazer uma analise internacional tendo os interesses nacionais como um bloco hegemônico, mas também se deve analisar as brigas dentro do estado pela hegemonia. Todos conhecem a historia da guerra de tróia, ter o visto o filme (na qual Brad Pitt deveria ganhar o premio de pior ator) ajuda bastante a compreender a questão, mas vamos a ela:
O que causou a Guerra de Tróia?
Segundo um cientistas político, Agamemon tinha um projeto de poder, ele queria unificar a Grécia e aproveitou a oportunidade.
Segundo um geógrafo, a guerra ocorreu por causa do território onde se localizava Tróia que era próximo ao trajeto das caravanas de comercio entre a Europa e a Ásia.
Segundo um sociólogo, a sociedade grega era divida em estamentos, o estamento dominante ligados aos militares precisavam se mostrar atuantes para manter seu status, isto é, a sociedade grega para se manter como estava necessitava estar permanentemente em guerra.
Segundo um economista, a influência do setor econômico foi essencial, o setor estaleiro (dos barcos) que era grande então viu uma oportunidade de expansão e pressionou o estado neste sentido.
Segundo um advogado, ocorreu uma violação do direito internacional, a partir do roubo de um bem público grego, o seqüestro de Helena.
Segundo um psicólogo, temos que considerar a motivação pessoal de cada pessoa separadamente; por exemplo quando consideramos a luxuria de Paris em conquistar Helena, que topa a aventura de bom grado e a honra do seu irmão Heitor para com Paris, chegamos a uma escolha completamente injustificada coletivamente, mas plenamente justificada individualmente. Do lado grego temos uma outra serie de egos pessoais que combinados resultam na declaração de guerra.
Depois dessa exposição, na qual cada profissional destaca uma parte da trama, não há mais como ver o todo, como uniforme. Várias visões diferentes e factíveis sobre um mesmo assunto, evidenciam a incapacidade de uma única visão (dentre as 6) explicar totalmente o assunto. “como conceber o todo sem as partes, ou mesmo as partes sem o todo?” Considerando isto, como não lembrar de Asquintas
Fonte: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2005/10/334240.shtml

Tróia II

Gregos x Troianos, uma luta de homens e deuses
O que é verdade e o que é mito na lendária guerra de Tróia? Descobertas arqueológicas mostram o encontro da realidade com a ficção
por Carla Aranha
O mito da guerra de Tróia resiste à prova do tempo. Passam os séculos e a aventura narrada na Ilíada de Homero, um dos maiores clássicos de todos os tempos, continua a fascinar gerações, sendo considerada por muitos o ponto de partida da história da Grécia. Afinal, em meio aos escombros das muralhas troianas – localizadas numa esquina da Europa com a Ásia, na atual Turquia – estavam as sementes da civilização grega e de seus ideais de democracia e valorização do indivíduo. O conflito virou um marco na trajetória desse povo.
Mas o que o poeta grego, que teria vivido no século 8 a.C., conta na épica obra? Em primeiro lugar – é bom lembrar –, ele não presenciou o conflito. E compôs a Ilíada mais de 400 anos depois dos combates, com base em relatos orais. O resultado é um enredo de guerra, amor e morte em que até os deuses descem do Olimpo para os campos de batalha. No meio da escaramuça divina, Tróia foi varrida do planeta, por volta do ano 1200 a.C. Os gregos, liderados pela maior cidade da região, Micenas, cantaram vitória. Daí o fato de esses gregos anteriores à própria Grécia serem chamados de “micênicos”.
Segundo Homero, tudo começou com o rapto da bela Helena, esposa do rei Menelau, de Esparta. Páris, filho do soberano de Tróia, apaixonou-se por ela durante uma visita à Grécia e a levou na bagagem quando voltou para sua terra natal. Tomados pela ira, Menelau e seu irmão, Agamêmnon, rei de Micenas, arrastaram todos os conterrâneos para a briga e partiram para cima dos troianos.
Assim começou a luta. O cerco durou dez longos anos. E os gregos só conseguiram penetrar na cidade, que detinha uma posição estratégica para a navegação, na travessia entre o Mediterrâneo e o mar Negro, graças à astúcia. No relato de Homero, os micênicos construíram um gigantesco cavalo de madeira e o deixaram às portas da cidade rival. Os troianos aceitaram o presente como uma proposta de paz. Mas eles nem imaginavam que dentro da falsa oferenda estavam os melhores guerreiros inimigos, que abririam os portões de Tróia, decretando seu fim.
No final da história de Homero, a Grécia só tinha a comemorar: Tróia ficou em ruínas e Helena foi levada de volta para casa. Além disso, toda a família real troiana acabou morta, incluindo Páris, que – assim como Helena –, estava entre os seres mais belos do mundo. Era o início da civilização grega, que, mais tarde, influenciaria todo o Ocidente.
Mitos e verdades
A obra de Homero eternizou a guerra de Tróia. É óbvio, no entanto, que os versos da Ilíada não constituem um relato fiel do que aconteceu na cidade, localizada nas redondezas da atual Istambul, na Turquia. Até hoje, por exemplo, não foram encontradas evidências da existência da linda Helena ou do sedutor Páris. Por outro lado, descobertas arqueológicas indicam que, por trás da lenda, existem verdades. “Homero mistura na sua obra, como era típico da cultura grega da época, relatos históricos com narrativas míticas. Mas a história que ele conta é verossímil, apesar de ser muito difícil separar o joio do trigo”, avalia o historiador Francisco Marshall, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Já no final do século 19, pesquisas conduzidas na Turquia levaram à descoberta de Tróia. A existência da cidade estava, então, comprovada. E, recentemente, novas escavações permitiram mais revelações. “Esqueletos humanos, inscrições de cerâmica e as próprias muralhas da cidade comprovam que Tróia foi atacada diversas vezes em um curto período de tempo, vindo a sucumbir completamente”, conta o arqueólogo Manfred Korfmann, líder de uma equipe de 350 especialistas que vêm esmiuçando a região desde 1993. Segundo o arqueólogo, a descoberta de antigos muros que cercavam a cidade, além de cerâmicas que reproduzem o formato das muralhas, também indica que Tróia foi um local muito importante e um possível alvo de potências emergentes. A grandeza é reforçada em escritos do Império Hitita, importante civilização que habitou a Anatólia. De acordo com os registros, troianos e hititas tinham uma estreita relação.
Professor da Universidade de Tübingen, na Alemanha, Korfmann também sai em defesa de Homero. Segundo ele, o poeta grego descreveu corretamente a geografia local. “Não existe nenhum registro arqueológico que contradiga a percepção de que Tróia e a região ao redor da cidade formaram o cenário histórico da Ilíada”, diz o arqueólogo. “Hoje tudo sugere que o poeta deve ser levado a sério. Seu relato do conflito militar entre gregos e troianos é baseado na memória histórica dos eventos”, acredita.
Fonte:http://historia.abril.com.br/guerra/gregos-x-troianos-luta-homens-deuses-434046.shtml
Para aprofundar o tema:

Tróia I


Mitologia e História.
A princípio, duas realidades que poderiam ser excludentes uma à outra, dadas suas características tão diversas, já que uma tem base em uma tradição religiosa e fantástica e a outra, um alicerce calcado em métodos e elementos pretensamente científicos.No entanto, falar da Antigüidade histórica é tratar da reconstrução de um período com base em indícios, que podem ter origem em elementos arqueológicos, em ponderações científicas sobre a evolução do ser humano e do meio ambiente e até nas tradições orais, passadas de geração a geração, e que, em algum momento, foram perpetradas em registros escritos.Com a chegada aos cinemas da superprodução Tróia, do diretor Wolfgang Petersen, surge sempre a curiosidade de se saber o que é real e o que é imaginário em uma história como a da Guerra de Tróia. Há realidade no que contou Homero, o grande autor grego que teria vivido por volta do século VIII a.C. e a quem é creditada a autoria dos poemas épicos Ilíada e Odisséia, principais obras que relatam o drama troiano? Ou trata-se simplesmente de um relato criativo de tradições orais que remontam séculos?Homero existiu?A própria existência de Homero é posta em dúvida em alguns momentos. Além disso, caso o autor grego tenha escrito mesmo os dois poemas, relatando a tal Guerra de Tróia, o teria feito cerca de quatrocentos anos depois de o fato ter realmente ocorrido, segundo a tradição, em uma época em que a escrita com base no alfabeto ainda não era dominada pela civilização que habitava o Mediterrâneo de então. Infere-se, portanto, que toda a história teria sido passada oralmente, de geração a geração, com todas as influências que esse tipo de transmissão do conhecimento tende a sofrer.Tendo um fundo de realidade ou não, a verdade é que a obra de Homero, inserida no chamado Ciclo Troiano da tradição antiga, exerceu grande influência sobre a formação do que hoje conhecemos como a Cultura Ocidental, cujo berço está justamente na civilização grega antiga. Sobre os textos de Homero foi construída toda uma tradição que viria a se tornar a base da formação da tradição grega. Platão, um dos maiores filósofos dessa tradição, que teria vivido mais de trezentos anos depois de Homero, reconhecia a relevância do autor."A importância de Homero na literatura grega é enorme. Ele é considerado o primeiro poeta, o primeiro aedo (poeta, em grego). Platão, séculos depois de Homero, ainda dizia que Homero educou a Grécia. Quer dizer, a influência da tradição oral Homérica foi muito forte em toda a cultura grega. Sem dúvida. Você vai estudar a épica grega, você começa por Homero. Você vai estudar a tragédia grega, você começa relacionando com Homero. Você vai estudar medicina grega, você começa pensando naqueles detalhes de onde iam as flechas na guerra, segundo Homero. Se você for estudar retórica, você vai pegar os discursos de Homero", analisa a professora de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH-USP (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo), Filomena Hirata.Porém o purismo histórico, calcado sempre em métodos os mais científicos possíveis, impede que aquilo que foi escrito por Homero seja aceito com uma real descrição de fatos que teriam ocorrido em Tróia.Ciência com base em HomeroNo entanto, alguns indícios, principalmente arqueológicos, abriram portas para que as histórias contadas na Ilíada e na Odisséia possam ser compreendidas como possuidoras de um fundo de verdade."Os poemas de Homero, a Ilíada e a Odisséia são narrativas tradicionais que reportam a memória desse povo. Esses poemas têm a função social de reunir o saber, os padrões de comportamento, as informações que interessam à vida em todos os sentidos. Heinrich Schliemann, no século XIX, estava convencido de que estas histórias tinham um fundo verdadeiro no sentido histórico. E ele foi escavar em Troada, que é o lugar em que supostamente se passaram os combates, que coincide com a atual Turquia. Seguindo a reconstituição que Homero fez da descrição de batalhas, do palácio de Príamo (rei de Tróia durante a guerra, segundo a Ilíada), descobriu várias cidades soterradas. Uma delas ele identificou como sendo a Tróia de Príamo. Depois disso, ele fez escavações em Micenas (na Grécia) e recuperou o palácio de Micenas. Descobriu tumba e tesouro que ele atribuiu a Agamenon (rei de Micenas, chamado também de rei dos reis, líder dos aqueus - como eram chamados os gregos na Ilíada - na Guerra de Tróia, segundo Homero). Então, ele estava convencido de que havia descoberto a tumba de Agamenon, seus tesouros, a cidadela de Príamo. Os arqueólogos posteriores não tinham tanta certeza quanto à identificação dos pormenores. Mas, com isso se demonstrou que havia um fundo de verdade nessas lendas contadas pelos poemas", lembra o professor Jaa Torrano, de Literatura Grega da FFLCH-USP.Assim, Torrano avalia que a história se mistura à tradição relatada por Homero. "Tem um fundo histórico na guerra de Tróia. Teria havido uma cidade que foi saqueada. Teria havido uma coligação dos gregos continentais contra outro povo que vivia na Turquia. Tem um fundo de verdade, como se fosse um romance histórico. Os episódios são, provavelmente, criação do narrador, mas tem um pano de fundo verdadeiro."Vale lembrar que em suas escavações na atual Turquia, Schliemann encontrou dez cidades construídas umas sobre as outras, considerando que a sétima cidade mais antiga seria a Tróia de Príamo.A conclusão de Schiliemann de que teria comprovado a existência de Tróia por suas escavações é questionada, por exemplo, pelo historiador José Otávio Nogueira Guimarães, professor do Departamento de História do Instituto de Ciências Humanas da UnB (Universidade de Brasília)."Schliemann vai dizer em um primeiro momento: `Está provado, Tróia existiu. Esses tesouros que foram encontrados aqui pertenciam à aristocracia troaiana, o que foi encontrado em Micenas pertencia aos heróis aqueus que vão lutar contra Tróia´... Mas, em seguida, essas descobertas de Schliemann também vão ser postas em questão... Porque a cidade onde teria sido encontrado o que se chama de tesouro troiano, objetos de ouro, a cidade mais rica, pelas datações arqueológicas remonta a 2.500 e 2.200 a.C., quer dizer, um período bem anterior àquele ao qual, segundo a tradição, teria se passado a guerra, no final do século XII a.C.... A cidade que pela data da tradição corresponderia à Tróia arqueológica seria a Tróia 7ª-A. Essa Tróia 7ª-A parecia ser uma cidade relativamente pobre e que, segundo os indícios arqueológicos, teria sido destruída por um terremoto e não por uma empreitada militar", explica Guimarães.E Guimarães completa: "Depois os historiadores vão tentar buscar outros tipos de fonte para tentar esclarecer o contexto da guerra. Há os arquivos ititas, que fazem referência a Kaia. Porque o Império Itita se localizava mais ou menos onde hoje é a Turquia. E Tróia é uma cidade do litoral norte da costa da Ásia Menor, o litoral turco, hoje, e que praticamente estaria sob o domínio Itita. Foram buscadas referências entre estes textos ititas e o mundo micênico, mas pouca coisa foi encontrada, quase nada, a não ser uma referência aos aquigauas, que seriam possivelmente os aqueus (gregos), mas nada que viesse a comprovar a história".Na mesma linha, vai a avaliação da professora Filomena Hirata. "A História acho que é uma coisa diferente. Dizer que a Guerra de Tróia, tal qual ela é relatada na Ilíada de Homero, foi o que aconteceu historicamente não é uma verdade. Não teria sido possível ter havido uma guerra nos moldes que Homero conta, um cerco a uma cidade que durou dez anos. Isso era impraticável" , diz. "O que havia eram muitas guerras, mas eram guerras rápidas, guerras para conseguir bens. Os gregos saíam atrás de metais preciosos, escravos. Mas eram guerras rápidas. Pode até ter havido em um dado momento uma guerra por causa de uma mulher, mas não nos moldes que conta Homero", acrescenta."Ainda que haja um sítio arqueológico escavado já há muito tempo - através dos trabalhos do alemão Schliemann, localizado em Tróia, que corresponderia hoje a uma região da Turquia -, ainda que haja uma possível identificação entre uma das cidades estudadas por Schliemann com aquilo que poderia ser a antiga Tróia, tudo isso é muito difícil de ser rigorosamente provado", avalia Filomena Hirata.Diferenças culturaisÉ importante ter em mente que o que hoje compreendemos como sendo mitologia - um grupo de crenças que formam a base religiosa da Grécia Antiga - era compreendido e analisado de outra forma àquela época. "Para os gregos, não havia essa distinção (entre História e Mitologia). Eles imaginavam que todos esses eventos tinham acontecido, consideravam esses heróis seus antepassados distantes. Então eles acreditavam na historicidade deles", diz André Malta Campos, professor de Grego Antigo da FFLHC-USP."Claro que hoje a gente vê de uma outra forma. E ficam tentando, os historiadores, os arqueólogos, querem ver em Homero o que pode ser um retrato do que de fato aconteceu. Não há como a gente saber com certeza. Há como sabermos que houve guerras em Tróia, várias destruições de Tróia, e a tendência é localizar a destruição dessa Tróia retratada por Homero no século XII a.C., entre as várias camadas arqueológicas que existem de Tróia, e tentar buscar em Homero elementos que retratem algum período da Grécia Antiga. Mas, na verdade, Homero é um miscelânea de elementos", afirma Campos.O que é certo é notar que, segundo as observações históricas, a prática do saque pelo uso da força, a partir da guerras como instrumento de conquista, era corriqueira em meios às civilizações antigas. Segundo o professor José Guimarães, hoje, acredita-se que se há algum núcleo histórico nos relatos de Homero isso está ligado a uma guerra de pilhagem que teria virado esse acontecimento grandioso pela imaginação poética."Guerras de pilhagem eram extremamente comuns nesse mundo. A guerra era um fato econômico. Você organiza excursões além mar para fazer escravos, saquear tesouros. Então a guerra de pilhagem era um exemplo corriqueiro nesse mundo Mediterrâneo no final do milênio antes de Cristo", diz o professor da UnB.Por outro lado, o professor Jacyntho Lins Brandão, de Língua e Literatura da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), lembra a criação de instrumentos de observação que viriam a ser aplicados por historiadores para depurar indicações históricas a partir de relatos da tradição oral ou mesmo da Literatura e da arte.Brandão lembra as observações historiador grego Evêmero, do século IV a.C. Segundo o historiador - de cujo nome derivou o termo evemerismo (doutrina segundo a qual as personagens ou heróis mitológicos são seriam humanos divinizados após a morte, como definido no dicionário Aurélio) -, ao separar dos mitos aquilo que é fantasioso, chegaríamos a um fundo de verdade, a uma origem histórica.Jacyntho Brandão, explica que "se eu trabalhar uma tradição mitológica qualquer, e não só a grega, eu chego a um fundo de verdade que ela tem, desde que eu consiga identificar quais são os elemento de fabulação poética que estão sendo colocados em cima de um texto histórico. Vou dar um exemplo do Brasil para entender o que é isso. Nós temos aqui, na História do Brasil, Getúlio Vargas. Não temos dúvida nenhuma de que isso é História. Se a gente pegar um cordel do Nordeste, nós vamos encontrar algo assim: a chegada de Getúlio Vargas ao inferno. Quer dizer, se a gente não tivesse documento histórico sobre Getúlio Vargas, esse cordel - vamos pensar daqui a mil anos - é uma referência de que Getúlio Vargas existiu. Aí podemos pegar esse cordel, tirar o que é maravilhoso e então você encontra o resto de história ali"."O extraordinário em relação a Homero é que os gregos já ficavam discutindo: será que isso é verdade? Homero não estava na Guerra de Tróia, como é que ele podia saber o que aconteceu lá? Havia várias leituras de Homero, desde ele ser lido como um historiador durante a Antigüidade toda, até as críticas que pensavam que tudo ali era alegórico, então precisava ter uma hermenêutica para entender o sentido dos poemas, até pensar que tudo aquilo era mentira", afirma Brandão." No século XIX, quando (Heinrich) Schliemann resolve descobrir onde ficava Tróia, e usa os poemas de Homero para poder ver qual era a localização, ele vai lá para o lugar onde hoje é a Turquia, a partir das indicações de Homero, e descobre Tróia. Este é o dado, em princípio inacreditável, se não tivesse sido descoberto, que provocou uma série de reflexões sobre a poesia de Homero, de pensar que ali não há só poesia, de que mesmo esse material, recebendo uma tratamento poético, está guardando uma memória sim, uma memória histórica de tradição oral", analisa o professor da UFMG.A Mitologia presenteSupondo-se então que os poemas de Homero possuem um fundo de verdade - que seja um relato de uma tradição histórica passada de eventos e personagens, mais alegoricamente ou menos -, é interessante notar a presença dos mitos religiosos na ação. Os deuses do Olimpo e outras figuras fantásticas, descritos tão detalhadamente na tradição mitológica grega, estão presentes nas histórias da Ilíada e da Odisséia.Essas figuras mitológicas são atores nas obras de Homero. Interferem na trama e são afetados pelos efeitos produzidos durante a Guerra de Tróia. Até mesmo o principal herói da Ilíada, Aquiles, é um semideus, isto é, filho de uma deusa (Tétis) com um humano (Peleu)."Quando a gente está falando de mito, e daí vem a palavra grega mythos, o primeiro sentido do termo em grego é de discurso, narrativa. Inclusive o verbo que vem daí é o verbo normal antigo, em Homero, que significa falar, narrar. Então, numa primeira aproximação, mito é uma narrativa qualquer. A segunda coisa é que tipo de acesso a gente tem a isso, que chamamos de mitologia grega. Nós temos acesso só a partir do que foi escrito, e esse campo do mito, nesse contexto que é oral, que significa falar, dizer, contar, é uma coisa que simplesmente a gente não conhece: não havia gravador na época. Agora, quando a gente recebe essa mitologia escrita, recebe uma variedade muito grande de versões, então, dá uma impressão falsa quando se fala da mitologia grega, como se isso fosse um conjunto de textos oficiais que tem uma versão determinada. Seria mais interessante a gente pensar que nós temos não uma mitologia, propriamente, mas sim, temos mitografias. Nós temos vários registros escritos desse negócio indefinido que a gente não consegue saber dar o contorno direito, que seriam os mitos", avalia Brandão.EssênciaRetrato de parte de uma História antiga, colagem de mitos ou apenas uma obra literária. Seja como for classificado o legado de Homero, e todo o arcabouço cultural que se seguiu a ele a partir da tradição helênica, é certo inferir que tal produção foi de suma importância à formação de todo um arcabouço que deu base à sociedade ocidental.Desses fundamentos, valores e princípios que perduram até hoje foram desenvolvidos os fundamentos, valores e princípios atuais. Hoje, pode-se dizer que toda a humanidade é influenciada, direta ou indiretamente, por aquilo que foi legado daqueles primórdios históricos, literários, mitológicos. No entanto, permanece sempre a curiosidade natural do ser humano em relação a sua origem e a seu destino. Quem sabe, um dia, contaremos com tecnologia que reconstrua momentos passados e revele "as verdades".Como disse Chico Buarque em sua canção "Futuros Amantes", sobre o amor que pode "esperar em silêncio", no futuro: "Sábios em vão/Tentarão decifrar/O eco de antigas palavras/Fragmentos de cartas, poemas/Mentiras, retratos/Vestígios de estranha civilização".
http://hitzblog.blogspot.com/2009/03/mitologia-e-historia-sobre-o-lancamento.html
Atividades on-line sobre Tróia:

domingo, 15 de novembro de 2009

AO MESTRE COM CARINHO

Só para lembrar.
Ao Mestre Com Carinho (1967)

Mark Thackeray é um engenheiro negro desempregado que, enquanto não consegue um novo emprego em sua área, decide aceitar uma proposta para dar aulas numa escola secundária de Londres, no bairro operário de East End.
Ao chegar lá, lhe é dada uma classe de adolescentes que cursam o último ano e que não querem nada com a vida. Os alunos, sem exceção, são extremamente indisciplinados. Liderados por Denham, Pamela Dare e Barbara Pegg, estão determinados a destruírem Thackeray, como fizeram com seu antecessor.
Em sua primeira aula, percebe que a missão que tem pela frente não vai ser fácil de ser realizada. Entretanto, acostumado a hostilidades, principalmente por ser negro, enfrenta o desafio, mesmo com seus colegas professores não acreditando na possibilidade de qualquer êxito.
O tempo passa, sempre sofrendo a hostilidade crescente dos alunos, principalmente de Denham, não conseguindo passar a matéria prevista no currículo. Certo dia, o grupo o irrita a tal ponto que ele termina perdendo a calma, única coisa que havia jurado nunca perder. Em plena sala de aula, pega todos os livros e os joga numa lixeira, alegando serem os mesmos inúteis para aquele grupo.
Em seguida, diz aos alunos que, daquele momento em diante, vai passar a tratá-los como adultos responsáveis que, em poucas semanas, estarão deixando a escola e enfrentando o mundo que os aguarda, batalhando por uma vaga no mercado de trabalho, com todas as responsabilidades exigidas pela vida adulta.
O conteúdo das aulas passa a ser uma conversa franca entre professor e alunos sobre os mais diversos temas como, por exemplo, a vida, sobrevivência, amor, morte, sexo, casamento. Antes de mais nada, entretanto, todos vão ter que se submeter a certas formalidades que fazem parte do mundo competitivo que os aguarda, desde a forma de se tratarem entre si, com respeito, à forma de se vestirem.
A estratégia adotada por Thackeray dá certo e, em pouco tempo, ele se torna o grande líder da classe. Denham ainda tenta hostilizá-lo, mas termina se curvando diante da nova realidade.
Ao final do ano letivo, pouco antes das festividades de encerramento, Thackeray recebe uma carta que o confirma no cargo de engenheiro-assistente de uma fábrica de rádios no interior. Entretanto, após receber uma calorosa e carinhosa homenagem de seus alunos, tem dificuldades em se decidir se aceita o novo emprego ou se continua a lecionar na referida escola.

Ao Mestre com Carinho.
Quero aprender sua lição que faz tão bem pra mim
Agradecer de coração por você ser assim
Legal ter você aqui
um amigo em que eu posso acreditar
Queria tanto te abraçar
Pra alcançar as estrelas não vai ser fácil,
mas se eu te pedir você me ensina como descobrir qual
é o melhor caminho
Foi com você que eu aprendi a repartir tesouro
Foi com você que eu aprendi a respeitar os outros
Legal ter você aquium amigo em que eu posso acreditar
Queria tanto te abraçar
Pra mostrar pra você que eu não esqueço mais essa
lição
Amigo, eu ofereço essa canção
ao mestre com carinho
Foi com você que eu aprendi a repartir tesouro
Foi com você que eu aprendi a respeitar os outros
Legal ter você aqui
um amigo em que eu posso acreditar
Queria tanto te abraçar
Pra mostrar pra você que eu não esqueço mais essa
liçãoAmigo, eu ofereço essa canção
ao mestre com carinho

domingo, 8 de novembro de 2009

DESAPARECIDOS POLÍTICOS - Campanha.

O Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil, denominado "Memórias Reveladas", foi institucionalizado pela Casa Civil da Presidência da República e implantado no Arquivo Nacional com a finalidade de reunir informações sobre os fatos da história política recente do País.
Dando continuidade a iniciativas dos últimos governos democráticos, em novembro de 2005, o Presidente Lula assinou decreto regulamentando a transferência para o Arquivo Nacional dos acervos dos extintos Conselho de Segurança Nacional, Comissão Geral de Investigações e Serviço Nacional de Informações, até então sob custódia da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e passou à Casa Civil a coordenação do recolhimento dos arquivos.
O Centro constitui um marco na democratização do acesso à informação e se insere no contexto das comemorações dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Um pedaço de nossa história estava nos porões. O "Memórias Reveladas" coloca à disposição de todos os brasileiros os arquivos sobre o período entre as décadas de 1960 e 1980 e das lutas de resistência à ditadura militar, quando imperaram no País censura, violação dos direitos políticos, prisões, torturas e mortes. Trata-se de fazer valer o direito à verdade e à memória.
A criação do Centro suscitou, pela primeira vez, acordos de cooperação firmados entre a União, Estados e o Distrito Federal para a integração, em rede, de arquivos e instituições públicas e privadas em comunicação permanente. Até o momento, em 13 Estados e no Distrito Federal foram identificados acervos organizados em seus respectivos arquivos públicos. Digitalizados, passam a integrar a rede nacional de informações do Portal "Memórias Reveladas", sob administração do Arquivo Nacional.
Essa iniciativa inédita está possibilitando a articulação entre os entes federados com vistas a uma política de reconstituição da memória nacional do período da ditadura militar. Os acordos firmados entre a União e os Estados detentores de arquivos viabilizam o cumprimento do requisito constitucional de acesso à informação a serviço da cidadania.
Estamos abrindo as cortinas do passado, criando as condições para aprimorarmos a democratização do Estado e da sociedade. Possibilitando o acesso às informações sobre os fatos políticos do País reencontramos nossa história, formamos nossa identidade e damos mais um passo para construir a nação que sonhamos: democrática, plural, mais justa e livre.
Dilma Vana RousseffMinistra-Chefe da Casa Civil

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Homenagem

Nunca é tarde para homenagear um grande intelectual



Morre Claude Lévi-Strauss
Ele é considerado o fundador da Antropologia Estruturalista.
Entre 1935 e 1939, lecionou sociologia na USP.


Foi anunciada nesta terça-feira (3) a morte do antropólogo Claude Lévi-Strauss. A informação é da editora do intelectual, pela qual o falecimento teria ocorrido entre sábado e domingo. Criado em Paris, ele nasceu em Bruxelas em 28 de novembro de 1908. Fundador da Antropologia Estruturalista, é considerado um dos intelectuais mais relevantes do século 20.
Membro de uma família judia francesa intelectual, Lévi-Strauss estudou Direito e Filosofia na Sorbonne, em Paris. Lecionou sociologia na recém-fundada Universidade de São Paulo (USP), de 1935 a 1939, e fez várias expedições ao Brasil central.
Ali passou breves períodos entre os índios bororós, nambikwaras e tupis-kawahib, experiências que o orientaram definitivamente como profissional de antropologia.
Em 1955, publicou "Tristes Trópicos" - um registro dessas expedições. No livro, ele conta como a vocação de antropólogo nasceu durante as viagens ao interior do Brasil.
Jamais aceitou a visão histórica da civilização ocidental como única
Após retornar à França, em 1942, mudou-se para os Estados Unidos como professor visitante na New School for Social Research, de Nova York, antes de uma breve passagem pela embaixada francesa em Washington como adido cultural.
Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele"
Fez parte do círculo intelectual de Jean Paul Sartre (1905-1980), e assumiu, em 1959, o departamento de Antropologia Social no College de France, onde ficou até se aposentar, em 1982.
Lévi-Strauss passou mais da metade de sua vida estudando o comportamento dos índios americanos.
Jamais aceitou a visão histórica da civilização ocidental como única. Enfatizava que a mente selvagem é igual à civilizada.
As contribuições mais decisivas do trabalho de Lévi-Strauss podem ser resumidas em três grandes temas: a teoria das estruturas elementares do parentesco, os processos mentais do conhecimento humano e a estrutura dos mitos.
Aos 97 anos, em 2005, recebeu o 17º Prêmio Internacional Catalunha, na Espanha.
Declarou na ocasião: "Fico emocionado, porque estou na idade em que não se recebem nem se dão prêmios, pois sou muito velho para fazer parte de um corpo de jurados. Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele - isso é algo que sempre deveríamos ter presente".

Bibliografia publicada no Brasil
As Estruturas Elementares do Parentesco (Vozes, 2003)
Antropologia Estrutural (Vol. 1) (Cosac Naify, 2008)
Antropologia Estrutural (Vol. 2) (Tempo Brasileiro, 1993)
O Pensamento Selvagem (Papirus, 2005)
Sociologia e Antropologia, de Marcel Mauss (introdução de Claude Lévi-Strauss, Cosac Naify, 2003)
O Cru e o Cozido - Mitológicas (Cosac Naify, 2004)
Do Mel às Cinzas - Mitológicas (Cosac Naify, 2005)
A Origem dos Modos à Mesa - Mitológicas (Cosac Naify, 2006)
O Homem Nu - Mitológicas (Cosac Naify, 2009)




Governo Jânio Quadros

Segue abaixo, a carta renúncia de Jânio Quadros. É necessário imprimir o texto que será trabalhado em sala, na próxima aula.
Carta renúncia de Jânio Quadros
"Fui vencido pela reação e assim deixo o governo. Nestes sete meses cumpri o meu dever. Tenho-o cumprido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções, nem rancores. Mas baldaram-se os meus esforços para conduzir esta nação, que pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, a única que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.
"Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou de indivíduos, inclusive do exterior. Sinto-me, porém, esmagado. Forças terríveis levantam-se contra mim e me intrigam ou infamam, até com a desculpa de colaboração.
"Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranqüilidade, ora quebradas, indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo que não manteria a própria paz pública.
"Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes, para os operários, para a grande família do Brasil, esta página da minha vida e da vida nacional. A mim não falta a coragem da renúncia.
"Saio com um agradecimento e um apelo. O agradecimento é aos companheiros que comigo lutaram e me sustentaram dentro e fora do governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade. O apelo é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios, para todos e de todos para cada um.
"Somente assim seremos dignos deste país e do mundo. Somente assim seremos dignos de nossa herança e da nossa predestinação cristã. Retorno agora ao meu trabalho de advogado e professor. Trabalharemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria."

Brasília, 25 de agosto de 1961.
Jânio Quadros

1. Explique as consequências das atitudes tomada por Jânio após a redação desse texto.

2. Destaque, no texto acima, um trecho que pode ser identificado ao populismo e justifique a sua resposta.

Aluno/Aluna:__________________________________________________n°______
Turma:______

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Questões sobre a década de 1960, nos vestibulares.

Questões de Vestibulares, comentadas, sobre a década de 1960

"Antes de vermos o golpe de 64 em si, é muito importante entendermos os caminhos tomados que levaram a ele, quais as conjunturas internas e externas que propiciaram a tomada do poder pelos militares. Para isso, vamos recuar um pouco na História e analisar uma série de questões a respeito do início da década de 1960 e do governo João Goulart:"
(Unesp-SP/2004) A renúncia de Jânio Quadros, em 1961, abriu um período de grande instabilidade política: havia aqueles que se opunham à posse do vice-presidente, João Goulart, e os que defendiam o cumprimento estrito da Constituição, que estipulava posse do vice em caso de renúncia ou morte do presidente.
a) Qual a saída política encontrada pelo Congresso Nacional para resolver o impasse?
b) Caracterize o governo Goulart, do ponto de vista político.

Comentários: A solução política encontrada pelo Congresso Nacional foi a adoção do sistema parlamentarista, com o objetivo de limitar o poder de João Goulart. O governo Goulart foi caracterizado por uma política de aproximação com os setores de esquerda, principalmente após o lançamento do programa das Reformas de Base. Contra essa aproximação, inúmeros setores conservadores, como as classes média e alta, parte da Igreja e das Forças Armadas, se opuseram a Jango, acusando-o de “subversivo” e de tentar implantar o comunismo no Brasil. Esses antagonismos geraram um clima de grande instabilidade política, que desembocaria no golpe de 64.

(UFF-RJ/2004) A partir de 1961, as Ligas Camponesas — formas de organização dos trabalhadores rurais — entraram em crise interna, devido a divergências entre suas lideranças. Uma defendia a adoção das teses da guerra de guerrilhas e a outra, representada por Francisco Julião e contrária a esta estratégia, tentou, sem sucesso, unificar novamente a direção do movimento. Com base nessa afirmação é possível dizer que, no decorrer dos anos 1960:
a) a organização dos movimentos sociais no campo foi aprimorada a partir da fundação de sindicatos rurais evangélicos.
b) os trabalhadores rurais brasileiros deram início a uma estratégia de ocupação em massa das grandes fazendas, por todo o Brasil.
c) os trabalhadores do campo foram vítimas do “perigo comunista”, dependendo do Golpe Militar de 1964 para libertá-los e reestruturá-los com base em acampamentos rurais;
d) os movimentos sociais no campo brasileiro passaram a ser conduzidos e orientados pela União Democrática Ruralista.
e) a organização dos trabalhadores rurais brasileiros passou a ser disputada por duas novas forças políticas: a Igreja e o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Comentários: Segundo o texto, as Ligas Camponesas, provavelmente influenciadas pelo movimento guerrilheiro da Revolução Cubana de 1959, encontravam-se divididas em 1961, com um grupo iniciando a tática de guerrilha para fazer a reforma agrária e lutar contra as injustiças dos coronéis nordestinos, e outro adotando a via pacífica, liderado pelo deputado Francisco Julião, Diante desse quadro, o movimento rural brasileiro passaria a ter novas influências em seu quadro, principalmente da igreja católica e do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Vale lembrar que o movimento das Ligas Camponesas entre 1955 e 1964 tem sido muito comparado com a atuação do Movimento Rural dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) atualmente no Brasil. Resposta correta: alternativa “E”.

(Fuvest-SP/1999) Sobre o governo de João Goulart (1961-1964), é possível afirmar que:
a) tomou medidas claras e definidas para a implantação do socialismo no Brasil.
b) propôs as chamadas “reformas de base” que pretendiam promover, entre outras, as reformas agrária e urbana.
c) fechou os olhos às lutas guerrilheiras que se implantavam em diversos pontos do Brasil.
d) foi antiimperialista, promovendo a ruptura das relações diplomáticas com os Estados Unidos.
e) tomou medidas drásticas contra os capitais externos, nacionalizando as empresas estrangeiras.

Comentários: As Reformas de Base faziam parte do plano apresentado pelo presidente Jango (Plano Trienal) que pretendia, através do corte de gastos públicos e da realização de reformas nas estruturas agrária, administrativa, bancária, tributária, eleitoral e educacional, reduzir a inflação e as desigualdades sociais.
Alternativa “B”.

(UFRN-RN/2000) Durante o governo do presidente João Goulart (1961-1964), o Estado brasileiro tentou implementar um extenso programa de reformas políticas e econômicas, conhecidas como “Reformas de Base”, as quais fracassaram devido à (ao):
a) Lei de Remessa de Lucros, que estimulou o envio de recursos financeiros de multinacionais instaladas no Brasil, às matrizes, no exterior.
b) oposição de expressivos grupos da sociedade brasileira, alarmados pela radicalização política de entidades ligadas aos trabalhadores.
c) reação ostensiva das ligas camponesas, principalmente no Sudeste, que promoveram uma campanha nacional, defendendo idéias desenvolvimentistas.
d) Plano Trienal, cujo sucesso levou importantes setores do empresariado brasileiro a considerarem inócuo o programa de reformas defendido pelo presidente da república.

Comentários: De um lado, o empresariado reclamava a queda do desenvolvimento econômico e da “postura comunista” das reformas de base. De outro, o operariado exigia agilidade nas reformas.
Resposta correta: “B”.

(Fuvest-SP/2002) “Na presidência da República, em regime que atribui ampla autoridade e poder pessoal ao chefe de governo, o Sr. João Goulart constituir-se-á, sem dúvida alguma, no mais evidente incentivo a todos aqueles que desejam ver o país mergulhado no caos, na anarquia, na luta civil.” (Manifesto dos ministros militares à Nação, em 29 de agosto de 1961).
Este Manifesto revela que os militares
a) estavam excluídos de qualquer poder no regime de democracia presidencial.
b) eram favoráveis à manutenção do regime democrático e parlamentarista.
c) justificavam uma possibilidade de intervenção armada em regime democrático.
d) apoiavam a interferência externa nas questões de política interna do país.
e) eram contrários ao regime socialista implantado pelo presidente em exercício.

Comentários: O manifesto, escrito após a renúncia de Jânio Quadros, demonstra a posição contrária dos militares em relação à posse do vice-presidente João Goulart, acusado de ser comunista.
Alternativa “C”.

(PUC-RS/1999) Ao longo dos governos Jânio Quadros e João Goulart, o Brasil buscou reorientar sua inserção internacional, pondo em prática a chamada Política Externa Independente. É correto afirmar que o objetivo norteador dessa política era
a) promover o estreitamento das relações econômicas e culturais com os países da África setentrional e do nordeste asiático.
b) estabelecer um espaço de liderança terceiro-mundista nas rodadas de negociação da Organização Mundial de Comércio.
c) acelerar o processo de negociações com a República Democrática Alemã para o desenvolvimento de um programa nuclear nacional.
d) romper a lógica de alinhamento incondicional aos EUA no contexto da Guerra Fria.
e) colocar o país na liderança militar de um sistema de defesa no Atlântico Sul, articulado à OTAN.

Comentários: Em tempos de Guerra Fria, o presidente João Goulart, em sua política externa, tentou acabar com a aproximação histórica existente entre Brasil e Estados Unidos. No entanto, essa política de independência dos EUA, reatando relações diplomáticas com a URSS, foi vista como uma aproximação com o comunismo, e esteve na base do golpe de 1964.
Alternativa “D”.

(Ufscar-SP/2000) O nome de República Populista designa o período histórico que se estende da queda de Getúlio Vargas em 1945 ao golpe militar de 1964. Alguns presidentes da República, por razões diversas, não completaram seus mandatos neste período.
a) Indique os nomes destes presidentes.
b) Em março de 1964, o presidente João Goulart participou de um comício no Rio de Janeiro com a finalidade de formalizar o início das reformas de base. Que medidas foram tomadas pelo presidente em consonância com este projeto de reformas e quais foram as suas conseqüências?

Comentários: Na resposta da alternativa “a”, você deve dizer que os presidentes que não completaram seus mandatos no período citado pela questão foram Jânio Quadros e João Goulart. Já na “b”, mais complexa, você poder dizer que as Reformas de Base previam o corte de gastos públicos e a realização da reforma agrária e estrutural de diversos setores da vida pública brasileira, como maneiras de conter a inflação e as desigualdades sociais. Tentando levar à frente o Plano Trienal, Jango, por inúmeras razões, desagradou tanto à esquerda quanto à direita, que temiam um golpe de Estado e enfraqueceu-se politicamente.

(Mack-SP/2004) A “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, em março de 1964, na cidade de São Paulo, foi:
a) uma demonstração de forças conservadoras de direita contra o que chamavam de esquerdismo e comunismo do governo João Goulart.
b) uma manifestação de apoio das famílias de trabalhadores brasileiros ao governo do presidente Goulart.
c) uma resposta das massas populares, apoiando as Reformas de Base, após o Comício na Central do Brasil (RJ/março de 1964).
d) uma demonstração de repúdio das classes trabalhadoras a uma possível intervenção militar, com apoio norte-americano, ao governo de Goulart.
e) uma manifestação, de setores conservadores da sociedade brasileira, de revolta contra a tentativa de se derrubar o governo constitucional.
Comentários: A “Marcha da Família pela Liberdade”, realizada em reposta ao Comício das Reformas na Central do Brasil (RJ), demonstrou a força da direita conservadora e contribuiu para desencadear o golpe militar que derrubou o presidente João Goulart em 1964.
Alternativa “A”.

(UFES-ES/2004) Ao assumir a presidência dos Estados Unidos, em 1961, o candidato democrata John Fitzgerald Kennedy viu-se compelido, devido à vitória da Revolução Cubana, a reforçar o sistema pan-americano de modo a preservar a hegemonia norte-americana sobre o continente e impedir o avanço do comunismo. Com esse propósito, convocou-se a Conferência Econômica e Social de Punta del Este, em agosto de 1961, ocasião em que foram fixadas diversas diretrizes, visando ao desenvolvimento da América Latina, com a previsão de um volume de investimentos externos da ordem de 20 bilhões de dólares, a serem desembolsados num prazo de dez anos. Esse projeto desenvolvimentista para a América Latina, gerenciado pelos E.U.A. e fruto da nova política externa implementada pelo governo Kennedy no contexto da Guerra Fria, ficou conhecido como:
a) Nova Fronteira.
b) Aliança para o Progresso.
c) Grande Estratégia.
d) Política da Boa Vizinhança.
e) Teoria da Contra-Insurgência.

Comentários: Objetivando conter o avanço da influência comunista na América Latina após a Revolução Cubana de 1959, os EUA tentaram se aproximar ainda mais dos países em desenvolvimento da região. Para tanto, em 1961, o presidente norte-americano John F. Kennedy criou a política da Aliança para o Progresso, que estabelecia a intensificação de investimentos financeiros norte-americanos na América Latina.
Alternativa “B”.

Depois desta batelada de exercícios sobre os antecedentes, vamos ver como os vestibulares abordaram o golpe militar de 1964. Aproveite para analisar alguns parâmetros que podem nortear seus estudos sobre a temática, principalmente a respeito das interpretações de texto e em questões conceituais como revolução, golpe ou contra-revolução para analisar o golpe de 1964.

(UFC-CE/2001) “Chefes altamente qualificados do Movimento de Março de 64 preferem chamá-lo contra-revolução. Com efeito, houve uma reação ao rumo desordenado e ameaçador das liberdades democráticas que a Nação tomava sob Goulart. (...) Março de 64 é, pois, uma resposta e não um projeto autônomo. Por isso, foi feito em nome do Anti: anticomunismo, antipeleguismo, anticorrupção”. (Jarbas Passarinho, Folha de São Paulo, 31/03/1982).
“Com efeito, o governo de Jango não caiu por seus defeitos... ele foi derrubado por suas virtudes. Essencialmente porque representava uma ameaça inadmissível para as classes dominantes. Quem viveu aqueles últimos meses de tensão recordará tanto a animosidade e o ódio que se alastraram por toda a casta de privilegiados contra o governo nacionalista e sindicalista, como o entusiástico apoio popular ao governo trabalhista e reformista”. (Darcy Ribeiro, Folha de São Paulo, 30/03/1982).
Com base nos testemunhos acima citados, faça o que é pedido abaixo.
a) Identifique os pontos de vista de cada um dos autores citados com relação ao golpe militar de 1964.
b) Compare os projetos políticos para o Brasil que estão implícitos nos dois trechos acima citados.

Comentários: Os depoimentos citados refletem divergências antagônicas em relação ao golpe de 1964. No primeiro fragmento, Jarbas Passarinho, um coronel, assume a defesa do movimento, assinalando o estabelecimento da ordem, contra o “caos” proposto pelos comunistas e outros subversivos instalados no governo, propondo-o como uma contra-revolução. Já Darcy Ribeiro, Chefe da Casa Civil do governo João Goulart, denuncia o caráter antidemocrático e de apoio às classes dominantes que o dito golpe assumiu.
Ao compararmos os projetos políticos, verifica-se que, no primeiro, o governo deveria se dedicar ao combate à corrupção, ao peleguismo e ao comunismo, assumindo uma postura de cerceamento das manifestações populares, apesar do discurso de defesa da nação. Para o segundo, o governo brasileiro pré-64 estava assumindo claramente um programa nacionalista, sindicalista, trabalhista e reformista, que ameaçava o poder das elites políticas e econômicas.

(Fatec-SP/2003) Em 31 de março de 1964, o general Mourão Filho, de Minas Gerais, iniciou um movimento de tropas em direção ao Estado da Guanabara. Em vários estados, movimentos militares eclodiram, apoiando Mourão. No dia seguinte, sem qualquer resistência do Governo de João Goulart, da população ou de militares legalistas, Jango foi deposto. A justificativa para a deposição de Jango pelos militares foi a seguinte:
a) Jango estava transformando o Brasil numa república sindicalista e comunista.
b) Jango estava realizando reformas que incomodavam os setores de exportação de mercadorias para Cuba e China.
c) Jango estava se desviando da Revolução Redentora, não querendo implantar a Reforma Agrária, aprovada pelo Congresso.
d) Jango havia realizado a reforma agrária desapropriando imensos latifúndios de empresas americanas, sem indenização alguma.
e) Jango não obedeceu a uma resolução do Supremo Tribunal Federal que regulamentava a Lei de Remessa de Lucros.
Comentários: O golpe militar de 1964 foi o resultado da crise do populismo, da conjuntura da Guerra Fria (EUA x URSS) e da polarização ideológica entre a esquerda reformista e a direita conservadora que acusava Jango de querer transformar o país numa República sindicalista de cunho comunista.
Resposta correta: “A”.

(FGV-SP/1998) Em relação ao Golpe Militar de 1964 no Brasil, pode-se dizer:
I- Foi fruto de uma conspiração civil-militar alarmada com os rumos nacionalistas do governo João Goulart.
II- Foi a forma encontrada pelos comandos militares para garantir a posse do novo presidente.
III- Representou a repulsa de setores da sociedade brasileira a tentativa de João Goulart de aumentar a presença do capital estrangeiro no país.
IV- Evitou a tentativa do Partido Comunista Brasileiro, de sindicatos de trabalhadores e de setores do Partido Trabalhista Brasileiro de exigir do presidente a implementação imediata das “reformas de base”.
Estão corretas as frases:
a) III e IV.
b) III e V.
c) I, II e III.
d) I, IV.
e) II, III e IV.
Comentários: No item II, afirma-se o contrário da intenção do golpe de 1964, que destituiu do cargo presidente João Goulart. No item III, o correto seria afirmar que o golpe representou a repulsa de setores da sociedade brasileira ao afastamento do capital estrangeiro do Brasil.
Alternativa “D”.
(UFJF-MG/2002)
"Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia (...) "
(Chico Buarque - Apesar de Você)

"Eu pisarei as ruas novamente
Do que foi Santiago ensangüentada
Numa bela praça libertada
Vou parar e chorar pelos ausentes
Vão retornar os livros, as canções
Queimadas todas por mãos assassinas
Renascerá meu povo de suas ruínas
E pagarão sua culpa os traidores. (...)"
(Pablo Milanés - Eu Pisarei as Ruas Novamente)

As letras das canções acima criticam os regimes militares instalados no Brasil (1964) e Chile (1973), respectivamente. Com base nas mesmas e em seus conhecimentos, responda ao que se pede:
a) Compare os contextos que antecederam os golpes militares em cada um dos países indicados.
b) Com base nas letras das canções, analise as relações entre governo e sociedade nos dois países, durante seus regimes militares.

Comentários: Na alternativa “A”, você deve apontar, dentre outros fatores que, em ambos os casos, havia propostas de mudanças econômicas e sociais. No caso chileno, o governo de salvador Alende da Frente Popular, eleito pelas urnas, implementou um processo de reformas que incluíam nacionalizações, como a da exploração do cobre, a estatização do sistema bancário e o desenvolvimento do processo de reforma agrária. No Brasil, o governo Goulart planejava a restrição da remessa de lucros das multinacionais, bem como as chamadas "reformas de base" – que incluíam as reformas agrária, urbana, bancária e administrativa. Contudo, estas propostas não chegaram a ser efetivadas no Brasil nas mesmas proporções do que no exemplo chileno e, em ambos os casos, os processos foram abortados pelos golpes militares.
Na alternativa “B”, tente identificar que os regimes militares em questão mantinham com a sociedade relações baseadas em elementos tais como: o autoritarismo, em suas mais diversas manifestações; o clima de medo e terror presentes na sociedade civil; a repressão política com a perseguição e assassinato de lideranças de oposição; a suspensão de direitos civis; a censura, dentre outros.

(Unicamp-SP/1996) “A palavra revolução tem sido empregada de modo a provocar confusões... No essencial, porém, há pouca confusão quanto ao seu significado central: sabe-se que a palavra se aplica para designar mudanças drásticas e violentas na estrutura da sociedade.” (Florestan Fernandes. O que é Revolução. SP: Brasiliense, 1981, p.7 e 8.)
Explique por que, segundo o conceito proposto por Florestan Fernandes, o movimento político de 1964 não foi uma revolução.

Comentários: Esta é uma questão clássica que faz com que o candidato pense em conceitos como revolução e golpe de Estado. Segundo Florestan Fernandes, os acontecimentos de 1964, por terem sido realizados por setores determinados com o intuito de conservar a manutenção da ordem, evitando alterar o status quo, distancia-se do conceito revolução; para ele, 1964 se aproximava de um golpe de Estado. Esta interpretação tornou-se bastante aceita, de modo geral, nas ciências humanas e é reproduzida na maioria das vezes, tal como estamos fazendo aqui no Zoom. Entretanto, como vimos no artigo “40 anos do golpe militar de 1964” desta edição, mesmo este conceito de golpe de Estado pode não ser suficiente para explicar o movimento militar de 1964, uma vez que restringe de alguma forma sua possibilidade de análise.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ameaça negra

Fustigando com suas ações o regime escravista, quilombolas assombravam o dia-a-dia de senhores e funcionários da colônia
João José Reis
A formação de grupos de escravos fugitivos se deu em toda parte do Novo Mundo onde houve escravidão. No Brasil, estes grupos foram chamados de quilombos ou mocambos. Alguns conseguiram reunir centenas de pessoas. O grande quilombo dos Palmares, na verdade uma federação de vários agrupamentos, tinha uma população de alguns milhares de almas, embora provavelmente não os quinze, vinte e até trinta mil habitantes que alguns contemporâneos disseram ter.
Depois de Palmares os escravos não conseguiram reproduzir no Brasil qualquer coisa próxima. Os senhores e governantes coloniais cuidariam para que o estrago não se repetisse. Foi criado o posto de capitão-do-mato (também conhecido como capitão-de-entrada-e-assalto e outros termos), instituição disseminada por toda colônia como milícia especializada na caça de escravos fugidos e na destruição de quilombos.
Assombrada com as dimensões de Palmares, a metrópole lusitana procurou combater os quilombos no nascedouro. No século XVIII quilombo já era definido como ajuntamento de cinco ou mais negros fugidos arranchados em local despovoado. Essa definição, concebida para melhor controlar as fugas, terminou por agigantar o fenômeno aos olhos de seus contemporâneos e de historiadores posteriormente. Contados a partir de cinco pessoas, o número de quilombos foi inflacionado nos documentos oficiais. Mas se, em geral, não figuravam como ameaça efetiva à escravidão, eles passariam a representar uma ameaça simbólica importante. Os quilombolas povoaram pesadelos de senhores e funcionários coloniais, além de conseguir fustigar com insistência desconcertante o regime escravista.
Para senhores e governo, o problema maior estava em que na sua maioria os quilombos não existiam isolados, perdidos no alto das serras, distantes da sociedade escravista. Embora em lugares protegidos, os quilombolas amiúde viviam próximos a engenhos, fazendas, lavras, vilas e cidades. Mantinham redes de apoio e de interesses que envolviam escravos, negros livres e mesmo brancos, de quem recebiam informações sobre movimentos de tropas e outros assuntos estratégicos. Com essa gente eles trabalhavam, se acoitavam, negociavam alimentos, armas, munições e outros produtos; com escravos e libertos podiam manter laços afetivos, de parentesco, de amizade.
É claro que houve muitos casos de quilombos isolados, às vezes encontrados por expedições que até desconheciam sua existência. Mas as evidências para o próprio Palmares, e mais ainda para os quilombos que o sucederam Brasil afora, apontam para uma relação muito mais intensa entre quilombolas e outros grupos sociais. Quilombos como os que cercavam Vila Rica (atual Ouro Preto) no século XVIII, ou o do Catucá, que se desenvolveu nos arredores de Recife e Olinda entre 1817 e 1840, aqueles instalados em redor de Salvador e de São Paulo nas primeiras décadas do século XIX, o quilombo do Piolho nas vizinhanças de Cuiabá, na década de 1860, os fluminenses da bacia do Iguaçu e da periferia da Corte, assim como os da periferia de Porto Alegre, ao longo do século XIX, todos mantinham redes de comércio, relações de trabalho, de amizades, parentesco, envolvendo escravos, negros livres e libertos, comerciantes mestiços e brancos. A essa complexa trama de relações Flavio Gomes chamou de “campo negro”, um espaço social, econômico e geográfico através do qual circulavam os quilombolas, que incluía senzalas, tavernas, roças, plantações, caminhos fluviais e pântanos, alcançando vilas de pequeno porte e cidades do porte do Rio de Janeiro, quando já era a mais populosa do Brasil em meados do século XIX.
Essas relações de alto risco atormentavam senhores e governantes coloniais e imperiais. Os amocambados também assaltavam viajantes nas estradas, às vezes tornando-as intransitáveis, e atacavam povoados e fazendas, onde roubavam dinheiro e outros bens, recrutavam ou seqüestravam escravos. Mas além de assaltar, roubar e seqüestrar, eles também plantavam, colhiam, caçavam, constituíam família.
São numerosos os relatos que dão conta da destruição de roças de milho, frutas, algodão, cana e outros produtos cultivados pelos quilombolas. Cultivavam, sobretudo, a mandioca, com que faziam farinha eles próprios. Quando atacados, as roças eram arrasadas para “não tornarem a servir de Criminozo azilo”, como escreveu o capitão-mor que destruiu os quilombos do Orobó e Andaraí na Bahia, em 1796.
Nas áreas de mineração os fugitivos se dedicavam à prospecção de pedras e metais preciosos, que trocavam clandestinamente com taverneiros por produtos necessários à sua sobrevivência, além de armas e munição. Em alguns casos conseguiam o suficiente para comprar a alforria, passando de negros fugidos a negros libertos.
Segundo a historiadora norte-americana Mary Karasch, os quilombolas de Goiás descobriram numerosas lavras auríferas, que eram posteriormente apropriadas pelos caçadores de escravos. A caça ao quilombola e a procura do ouro caminhavam juntas nas expedições feitas ao interior. A entrada realizada em 1769, a partir de Minas Gerais, pelo mestre-de-campo Inácio Correia Pamplona, foi saudada por um sertanejo versejador, que entre loas ao comandante arrematava:
Tudo feito nesta maneira
pólvora, chumbo e patrona,
espingardas à bandoleira,
entrando duas bandeiras
Procurando Negros e ouro,
Deus nos depare um tesouro
para garrochiar neste touro.
O historiador e etnólogo Edison Carneiro, a propósito, escreveu que “o quilombo [...] serviu ao desbravamento das florestas além da zona de penetração dos brancos e à descoberta de novas fontes de riquezas”.
No Rio de Janeiro oitocentista, os quilombolas de Iguaçu mantinham intenso comércio de madeiras com a Corte e também se empregavam nas fazendas de proprietários que sabiam estar contratando negros fugidos. No Maranhão, em 1867, um juiz de direito denunciava “A ambição desregrada de certos indivíduos, ambição que os leva a seduzir escravos para fugir, tendo em vista tirar vantagens com as colheitas destes, que as vendem por módicos preços”. Esta era, aliás, uma prática comum. Os donos de escravos frequentemente publicavam anúncios em jornais ameaçando de processo e exigindo indenização dos coiteiros. No sul da Bahia, na vila de Barra do Rio de Contas (atual Itacaré), em 1806, dezenas de escravos se aquilombaram numa comunidade de lavradores que os empregavam no cultivo da mandioca. Quando este quilombo, chamado Oitizeiro, foi disperso, descobriu-se que os próprios escravos dos lavradores eram prósperos produtores de mandioca e ativos coiteiros de calhambolas.
Fonte: Revista de História da Biblioteca Nacional.
Custo Brasil
Desde as invasões holandesas estava evidente: a colônia americana só era viável com o braço escravo angolano. Crescemos à custa da miséria africana.
Luiz Felipe de Alencastro
No Atlântico português formou-se uma matriz espacial colonial específica. De um lado, no litoral da América do Sul, desenvolveram-se uma economia e uma sociedade fundadas no trabalho escravo africano. Do outro, principalmente em Angola, mas também no Golfo de Guiné, situavam-se as redes de reprodução dessa mão-de-obra escrava. As duas margens do Atlântico Sul se completavam em um só sistema de exploração colonial, cuja singularidade ainda marca profundamente o Brasil contemporâneo.
No início do século XVII, a circulação de homens e mercadorias entre Brasil e Angola já era considerável. Uma das mais claras demonstrações da ligação entre as duas colônias aparece no encadeamento das invasões holandesas. Na estratégia holandesa, os portos comerciais dos dois lados do Atlântico Sul eram alvos conjugados.
Quando tomaram a Bahia, em 1624-5, os holandeses promoveram também o bloqueio naval de Benguela e Luanda. A segunda campanha atingiu o alvo em 1630, com a captura de Olinda e Recife. Cinco anos depois, a Zona da Mata pernambucana tinha caído sob o controle de Maurício de Nassau. No primeiro relatório que envia a Amsterdã, ele enuncia as regras do jogo colonial no Atlântico Sul. Adverte que não era qualquer um que servia para ser colono na Nova Holanda: os candidatos deveriam dispor de capital “para mandar fazer a fábrica de que precisam, pois não podem ser trazidas da Holanda como são aqui necessárias, e para comprar alguns negros, sem os quais nada de proveitoso se pode fazer no Brasil”. E insiste: “Necessariamente deve haver escravos no Brasil (...) é muito preciso que todos os meios apropriados se empreguem no respectivo tráfico na Costa da África”.
Admitida a necessidade do tráfico negreiro, faltava ainda montar o circuito transatlântico de compra, transporte e venda dos africanos. Em 1637, Nassau envia uma frota do Recife para capturar São Jorge da Mina, entreposto português de comércio de ouro e de escravos no litoral africano (atual Gana). Sem saberem ainda negociar escravos na África, os holandeses levam dois intermediários para tratar com os traficantes africanos. Mas, ao constatar que a região não era suficiente para dar conta do fornecimento de escravos a Pernambuco, Nassau lança seus navios sobre o maior mercado atlântico de cativos: Angola.
Luanda, Benguela e São Tomé caem nas mãos dos holandeses entre agosto e novembro de 1641. A captura dos dois pólos da economia de plantações – as zonas produtoras escravistas americanas e as zonas africanas reprodutoras de escravos – mostrava-se indispensável para o implemento da atividade açucareira. Nassau é enfático: sem o trato negreiro e os portos angolanos, o Brasil holandês seria “inútil e sem frutos para a Compagnie”.
Pelos mesmos motivos, Portugal se preocupava com a situação na América. Chegou a tentar um acordo com os holandeses para que as duas partes tivessem acesso ao comércio de escravos. Não teve sucesso, e em meados de 1643, Telles da Silva, governador-geral do Brasil, prevenia el-rei: “Angola, senhor, está de todo perdida, e sem ela não tem Vossa Majestade o Brasil, porque desanimados os moradores de não terem escravos para os engenhos, os desfabricarão e virão a perder as alfândegas de Vossa Majestade os direitos que tinham em seus açúcares”. Ou seja: sem o trato de Luanda, a colônia americana estava condenada. Diferentemente do que tem sido dito e escrito em boa parte da historiografia brasileira, o tráfico de escravos no Atlântico Sul era predominantemente bilateral, e não triangular.
Tropas, navios e munição em quantidades suficientes para o socorro da África Central não poderiam sair de Portugal, que continuava em guerra de fronteira com a Espanha e guerra marítima com a Holanda. Coube então ao Rio de Janeiro e às capitanias adjacentes – principais interessadas no restabelecimento do tráfico negreiro – a tarefa de fornecer gente e petrechos, “pois todo o Brasil necessita de escravos para seu remédio”. Por força das circunstâncias que coibiam a ação da metrópole, abriu-se espaço para uma co-gestão lusitana e “brasílica” (nome genérico para os colonos do Brasil) no Atlântico Sul.
É Salvador Correia de Sá e Benevides (1602-1688) quem conduz, em maio de 1648, a frota luso-brasílica que reconquistará Angola. Composta de onze naus e quatro patachos, com quase dois mil homens, a expedição é financiada em 70% por fundos coletados junto aos negreiros e fazendeiros fluminenses. Dispondo de um estado-maior experimentado no Atlântico Sul e de “boa gente e infantaria exercitada nas fronteiras nas guerras de Portugal e na campanha de Pernambuco”, o corpo expedicionário desembarca e, após combates em Luanda, vence os holandeses em agosto de 1648.
Num memorial enviado à Corte, a Câmara de Luanda reconhece explicitamente que os sucessos da reconquista de Angola “mal se lograriam se os moradores daquela ilustre cidade [o Rio de Janeiro] se não fintaram [tributassem] com uma muito grande soma de dinheiro com que a armada se forneceu e obrou o fim desejado”. Cinco anos mais tarde, a Câmara do Rio de Janeiro reivindicou orgulhosamente o mérito da expedição: “Quem pode negar a esta cidade a glória da restauração de Angola?” A história da expulsão dos holandeses deixou evidente que o Brasil tinha continuidade fora das fronteiras americanas.
A partir daí, a presença brasílica afirma-se na África Central. Depois da independência, Angola continua sob influência brasileira, e desde 1823 fala-se da presença em Luanda, e sobretudo em Benguela, de um “partido brasileiro”, que joga as cartas dos interesses negreiros dos escravistas do Império do Brasil contra a política colonial portuguesa. Do lado brasileiro também havia um “partido angolano”, que almejava anexar Angola ao Brasil. Esta estratégia anexionista foi claramente enunciada por Nicolau Pereira de Campos Vergueiro (1778-1859), pai da pátria, senador, regente do Trono e ministro, na Constituinte de 1823.
Nenhuma região escravista das Américas teve na África um peso similar ao do Brasil. A intervenção brasileira em Angola, como também no Golfo de Guiné, sobretudo no antigo reino do Daomé, só declina após 1850, com o fim do tráfico negreiro no Atlântico Sul. Concretamente, o ciclo mais longo da economia brasileira é o ciclo negreiro que vai de 1550 a 1850. Todos os outros – do açúcar, do tabaco, do ouro e do café – são, na realidade, subciclos dependentes do ciclo negreiro. Neste sentido, pode-se dizer que a construção do Brasil se fez à custa da destruição de Angola.
A dependência do tráfico negreiro e da escravidão também deixou efeitos perversos entre nós. O fato de pilhar durante três séculos a mão-de-obra das aldeias africanas facilitou o extermínio das aldeias indígenas, tornadas desnecessárias, e gerou entre os senhores de engenho, os fazendeiros e o próprio governo, uma brutalidade e um descompromisso social e político que até hoje caracterizam as classes dominantes brasileiras.
Luiz Felipe de Alencastro é professor titular da cátedra de História do Brasil da Universidade de Paris IV Sorbonne e autor de O trato dos viventes – formação do Brasil no Atlântico Sul, séculos XVI e XVII (São Paulo: Companhia das Letras, 2000).
Saiba Mais - Bibliografia:
BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti (orgs). História da expansão portuguesa. vol 1. Lisboa: Círculo dos leitores, 1998.
BOXER, Charles Ralph. O império colonial português (1415-1825). São Paulo: Companhia das Letras, 2002
THORNTON, John, A África e os Africanos na formação do mundo Atlântico,1400-1800 . Rio de Janeiro, editora Campus, 2004.
Fonte: http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=2125